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Dia D-29 – Faltam 29 dias para as eleições

Esta tarde celebrei vários casamentos. É algo que tenho feito regulamente nestes últimos tempos.

Curiosamente, decorreram vários meses sobre a minha nomeação como conselheira comunal até eu saber que podia celebrar casamentos. Fiquei estupefacta. Nunca me tinha passado pela cabeça que qualquer conselheiro pudesse representar a burgomestre para este efeito. Porque é disso que se trata: põe-se a faixa tricolor a tiracolo e eis-nos investidos do poder de declarar que, em nome da lei, a pessoa A e a pessoa B estão unidas pelos laços do matrimónio.

Na Cidade do Luxemburgo, os casamento realizam-se às quartas, quintas e sextas. Das segundas e terças, não reza a história: ninguém parece estar interessado em casar-se num desses dias. O caso muda de figura no que respeita ao sábado, dia em que os serviços municipais estão encerrados. Trata-se de algo que alguns partidos políticos gostariam de alterar (o meu por exemplo), para que uma parte desses serviços pudesse abrir ao público nesse dia. Uma maior flexibilidade nesta matéria,  por exemplo no que toca à celebração de casamentos, seria decerto vantajosa para os cidadãos.

No princípio de cada semana, a receção da comuna envia a todos os membros do conselho comunal a lista dos casamentos previstos para essa semana. Os conselheiros oferecem-se para os celebrar em função das suas disponibilidades ou da sua eventual proximidade relativamente aos noivos. Intimidada com a  questão da língua e com a possibilidade de ter de conduzir cerimónias em luxemburguês – não se tem, à partida, nenhuma indicação sobre qual será a língua desejada pelos noivos – mantive-me em silêncio até ao dia em que me vieram buscar: tratava-se de um casal, ela francesa alsaciana, ele brasileiro de origem japonesa, que queria transmitir a cerimónia para o Brasil e perguntou se não haveria um conselheiro que falasse português, a única língua falada pelos familiares do noivo. Gostei da experiência.

Celebrei hoje pela primeira vez um casamento em luxemburguês; o noivo era português e a noiva italiana. O casal romeno, o francês e a filipina, o polaco e iraniana escolheram o inglês. O casamento do casal marroquino, tal como o do casal senegalês, foi celebrado em francês. Por vezes, os noivos vêm acompanhados de um intérprete (lembro-me de um noivo bósnio que não falava inglês nem nenhuma das línguas do Luxemburgo). «É extraordinário como a cidade mudou», dizia-me um dia o funcionário do estado civil. «Todas as semanas é quase metade dos casamentos que é celebrada em inglês, que muitas vezes não é a língua materna de nenhum dos elementos do casal.» 

São pessoas vindas de todo o lado, muitas nascidas em sítios longínquos. Há casais que vêm sós, outros que trazem familiares e amigos. Uns atrapalham-se ao tentar enfiar a aliança no dedo do cônjuge, olham para mim e dizem «Desculpe, é a primeira vez…». Há noivas de calças de ganga, outras de véu e vestido de cauda branco, como a noiva senegalesa que chegou atrasada por que não conseguia estacionar. Há noivos de azul, branco ou vermelho. Uns trazem flor na lapela. Há homens que choram e mulheres que riem. Há quem se case com os cães ao lado. Há famílias que entoam cânticos em línguas que eu não conheço. É maravilhoso!

Celebrar casamentos permitiu-me contactar com comunidades com as quais eu ainda não me tinha cruzado e deu-me uma perceção mais fina da diversidade da população da capital. Quantos mundos há nesta cidade?

A nossa cidade é um mosaico de culturas cada vez intrincado. Fazer com que todos se conheçam e convivam de uma forma salutar, sem excluir ninguém, não é fácil. É mesmo um bico de obra. Todos os partidos políticos falam destas questões nos seus respetivos programas. É a parte que mais interessa ler, se não tiverem tempo de ler na íntegra os programas eleitorais que irão receber nas vossas caixas do correio. Leiam também nas entrelinhas.

Eduarda Macedo

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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