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“OCCUPY o Consulado”: fazer de cada emigrante um político

Ser emigrante em 2015 é luta e responsabilidade cívica. Ativismo. Resistência.

É uma luta pela dignidade humana numa Europa e num Mundo em contracção económica e democrática. Uma luta, pois, contra a exclusão social e cívico-política que a ideologia do austeritarismo gera. E é também uma responsabilidade cívica: não cruzar braços, não desistir, não deprimir, ser resiliente, avivar o espírito de comunidade, não permitir o acantonamento cívico. Exigir o espaço para a nossa participação política ativa.

Ao  empobrecer e desvalorizar o nosso país, em mais ou menos 4 anos os nossos des-governantes “expulsaram” mais de 400.000 portugueses.

Emigraram estes portugueses, jovens e menos jovens, qualificados e não qualificados, e assim aliviaram o sistema de segurança social português e assim não chatearam muito como proletariado precariado incómodo dentro de portas.

Emigraram e inundaram o mercado laboral da Europa, onde agora há muito mais oferta de mão-de-obra do que procura. Emigraram maciçamente e tornaram-se um factor de dumping salarial nesta mesma Europa. Os patrões e os directores regozijam-se. Muitos destes emigrantes portugueses – homens e mulheres que ainda há poucos anos tinham um vida normal e digna no seu próprio país – são o novo proletariado do velho continente, precários, vivendo situações de vulnerabilidade, de depressão psicológica, por vezes roçando o suicídio, sobrecarregando os sistemas de segurança social dos países de acolhimento, expondo-se a notificações de expulsão quando não têm um contrato de trabalho. Desesperam à procura desse mesmo contrato de trabalho e anunciam que aceitam tudo, colocando-se  à mercê de patrões e directores abusadores.

As comunidades residentes de emigrantes tentam organizar-se informalmente através das gentes e das estruturas do associativismo de longa data para prestar o apoio possível à vaga de novos emigrantes, já que os serviços de apoio social das embaixadas e consulados estão em progressivo shutting down.

E perante tanta emigração o austeritarismo anda a fechar alegremente os postos consulares que não dão lucro… lucro? Lucro? Mas têm de dar lucro? Que disparate é este? Os postos consulares são uma obrigação do Estado Português, assim como os hospitais, centros de saúde, tribunais , escolas.
Somos cinco milhões de emigrantes portugueses, cujas remessas aumentaram 7% em 2014, e seus lusodescendentes. Não nos podem fechar os consulados!!…

Os consulados que por ora permanecem (e que devem ser então os tais que dão lucro) estão a rebentar pelas costuras: o número de funcionários diminui e número de utentes aumenta. Que serviço é possível prestar? Como se pode fazer o recenseamento eleitoral? O ambiente é de opressão e frustração, tanto na sala de espera à cunha, como no espaço de atendimento. Exasperação.

Podia haver um serviço online para os assuntos consulares, podia. Mas não há. Não se percebe bem por quê, nesta era do home banking e do e-commerce. E sobretudo quando o investimento foi já mobilizado, e quando até o tal do serviço figura nas webpages dos consulados… serviço fantasma, mentira.

Podia haver recenseamento eleitoral automático como existe para o cidadão português residente em Portugal, podia. Mas não há. Por quê esta outra discriminação?

Neste cenário de consulados a fecharem, o cidadão português emigrante não tem à sua disposição um consulado virtual, nem serviços consulares online, ao contrário do que está disponível em Portugal para o cidadão português residente em Portugal. Discriminação, outra vez! Ora nós também somos cidadãos portugueses! Não somos cidadãos…

Lembremo-nos novamente do nosso contexto: a actual emigração portuguesa já atingiu níveis que ultrapassam a vaga migratória dos anos 60 e 70. Lembremos o básico: estes emigrantes afluem aos poucos consulados existentes porque precisam de documentos, atestados, certidões legais para resolver problemas relacionados com a sua instalação legal e com o seu novo posto de trabalho. Básico. E para conseguir o básico, é preciso perder 1 dia de trabalho, ir para Bruxelas, tirar senha, esperar a sua vez com 15 pessoas à frente e 2 funcionários no atendimento… ou então é preciso marcar, pelo telefone que nunca atende, uma hora de atendimento… parece que estamos em 1980.

Por muito que os cidadãos portugueses emigrantes alertem e se queixem, através de grupos comunitários, através dos meios de comunicação social da diáspora portuguesa, os seus eleitos pela emigração – que os deveriam representar – nada fazem de concreto e útil para mudar o status quo. O Secretário de Estado das Comunidades compreende a situação e tem muito boa vontade, mas também nada consegue para melhorar a actual situação de exclusão cívico-política imposta ao cidadão português emigrante pelo sistema político-partidário-legislativo reinante. O último exemplo é a revoltante redução do universo de emigrantes portugueses votantes para as eleições do Conselho das Comunidades Portuguesas, que a maioria dos deputados com assento na AR aprovou (provavelmente sem ter lido o texto). Muito conveniente para a actual maioria…

Narrativa muito conveniente, igualmente, o famigerado desinteresse e a famigerada abstenção eleitoral do cidadão português, incluindo o cidadão emigrante,…pois se tudo é um empecilho ao recenseamento eleitoral e ao voto! Pois se não há voto electrónico! Pois se não há campanha de informação!

Perante este desconcerto e desrespeito, nós cidadãos portugueses emigrantes só temos uma coisa a fazer:  “Occupy  o Consulado”

Ocupar e reclamar os serviços e o  espaço público cívico-político ao qual temos direito enquanto cidadãos. Estamos fora mas não estamos mortos. Somos portugueses, tal como os nossos concidadãos que residem em Portugal e que têm à sua disposição às lojas do cidadão – que cá fora são os consulados.

“Occupy o consulado” para exigir mais funcionários, permanências, apoio social, programa especial para o recenseamento eleitoral que está agora silenciosamente em curso com vista à eleição dos nossos representantes no Conselho das Comunidades Portuguesas (acto eleitoral cuja data será marcada em cima da hora, e sem comunicação nem divulgação).

Tal como os cidadãos de “Occupy New York” tiveram razão em relação ao iníquo sistema financeiro mundial, também os emigrantes portugueses têm razão em relação à discriminação, abandono e exclusão a que são votados pelas autoridades portuguesas. O encerramento e redução dos postos consulares, a obstaculização legislativa e regulamentar ao recenseamento eleitoral, as parcas modalidades de voto à distância, a redução do universo de votantes significam o ditatorial confinamento/clausura do espaço cívico-público-político, do qual o cidadão português emigrante fica de fora, excluído.

Tudo ao contrário das recomendações da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, na sua resolução 2043, de 6 de Março de 2015,  “Participação Democrática para os migrantes das Diásporas”, que exorta os governos dos estados membros (Portugal é um deles) a melhorar a participação democrática dos emigrantes, a envolvê-los na tomada de decisões, a redigirem (em conjunto com as instituições da sociedade civil) programas orientados para as diásporas.

Como se não bastasse terem sido obrigados a sair fisicamente do seu país, que é o espaço cívico-público-político mais próximo e local, os cidadãos portugueses sofrem agora ainda mais este agravamento da exclusão da comunidade simbólica da cidadania portuguesa.

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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