De que está à procura ?

Colunistas

Nomes

Há poucos dias descobri um papel com uma lista de nomes. Tinha sido feita quando eu tinha 27 anos e, num rasgo de alguma leviandade nostálgica, pensara em quantas pessoas iria querer ter ao meu lado caso estivesse à beira da morte e quantas delas iriam receber uma carta minha de despedida. Coisas de jovem lírica! Constavam 25 nomes nessa lista, o que era deveras imenso quando penso no meu mundo de hoje só 10 teriam direito à carta.

Não a descobri anexada à lista e nem sequer me recordo se a fiz. Mas a enumeração das pessoas fez-me pensar e estive com o papel nas mãos durante algum tempo como se tivesse feito uma descoberta de dimensão emocional surpreendente.

Se fosse hoje? Alguns dos nomes não constariam por razões óbvias. A morte levou-as. Outras porque a vida nos concede a viuvez da amizade e nem sempre se faz o luto devido. Há nomes sem presença e nomes que ainda me acompanham como se estivessem colados à minha pele irreversivelmente. E ainda bem, significam a longevidade dos meus pais, dos meus tios. Significam o amor simples. O que importa.

Hoje acrescentaria outros nomes que na data não pertenciam às pessoas que amo e que fazem parte do meu mundo .Umas porque ainda não existiam,como os meus filhos outras porque existindo eram desconhecidas no meu espaço e tempo. A lista sofreria profunda alteração e as cartas não seriam decerto entregues aos mesmos. A dinâmica fabulosa da vida que nos ensina que podemos ser tanto num momento e no instante seguinte mero apelo a um vento tristonho que passa rendido ao verão.

Quando tinha 27 anos a morte era um destino fugidio quase intangível. A lista resume um pouco essa visão algo fútil do estar na vida, como se a juventude fosse longa e operante face aos desgastes. No fundo, não se pensa muito nela, pensa-se como inevitável acontecer bastante distante.

Até por isso a lista não tem fundamento agora. A morte já está ligada à minha existência como um apêndice funesto. Conheço-lhe a vontade. Sei de mim novos modos de entender o companheirismo,a amizade,o desejo,o sonho. Sei agora o desespero do medo, a perda e o fulgor do afeto como não sabia aos 27. Sei agora como é difícil caminhar durante anos sobre estradas estreitas e margens descaídas, sei como é complicado aceitar os outros, como será difícil aos outros aceitar-me.

Da lista retiro nomes; acrescento outros. Os que surgiram depois e têm meu sangue. Não sei quantos nomes constariam se fizesse hoje a lista.Aliás, penso que não a faria simplesmente e sei que seguramente se a fizesse, teria muito menos. Mas todos os nomes escritos nela seriam muito mais sólidos dentro de mim, porque, afinal, apenas o amor se mantém, inabalável .

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

TÓPICOS

Siga-nos e receba as notícias do BOM DIA