Jovens lusodescendentes debatem empregabilidade em Portugal
Ao longo da última semana, cerca de 50 jovens falantes da língua portuguesa provenientes de dez países diferentes encontraram-se na cidade de Braga, onde trocaram ideias e partilharam experiências centradas no tema da empregabilidade no Encontro Europeu de Jovens Lusodescendentes, evento organizado anualmente pela associação francesa Cap Magellan.
Durante os cinco dias do maior evento de juventude lusodescendente na Europa, várias atividades orientadas em torno do tema “Empregabilidade: o Digital ao Serviço da Sustentabilidade e da Inclusão” deram origem a debates sobre o tema desta área crítica na vida destes jovens entre os 18 e os 35 anos.
Depois de os secretários de Estado do Trabalho e da Juventude afirmarem que Portugal tem as “portas escancaradas” para os jovens emigrantes e lusodescendentes que queiram “fazer vida” no país, na cerimónia de abertura do evento, em que estiveram presentes, quando confrontados com a realidade da empregabilidade jovem em Portugal, os mesmos jovens concordam que há muitos pontos a melhorar.
Ao longo das atividades decorrentes durante a semana, fatores como o baixo valor de ordenado, o elevado número de horas de trabalho, a falta de flexibilidade, ou o tipo de tarefas que lhes pedem para desempenhar, traçam um cenário de precariedade que todos reconhecem, e que concordam que é urgente e necessário mudar.
“Isto é o Estado a fugir com o seu dever para com o cidadão”, diz Vasco Suamo, de 33 anos, com residência em Portugal mas que atualmente se encontra na Alemanha a prosseguir os seus estudos em Relações Internacionais. O jovem defende que, ao contrário da realidade de muitos jovens em Portugal, ao não haver condições financeiras para ingressar no ensino superior, não deveria ser o estudante a ter que sacrificar o seu rendimento escolar para poder pagar os estudos. “Eu não vou à escola, vou trabalhar e fazer provas. Isto não existe”, diz em tom de indignação. Se o jovem ou a sua família não têm recursos para que possa prosseguir o ensino superior, “o Estado precisa de arranjar meios para tal”.
Dário Gomes, educador social de 30 anos, contribui com uma experiência pessoal: “eu fui trabalhador-estudante e, de facto, o Estado devia pensar sobre isto, devia dar condições aos jovens”, afirma. Durante a sua licenciatura, Dário trabalhava à noite e estudava durante o dia porque não tinha outra forma de conseguir pagar os estudos e se sustentar. “Conheço muitos jovens que, por questões financeiras, que é o que me deixa triste, e por causa da pandemia e do desemprego, não terminam a sua licenciatura”, acrescenta.
Para além da capacidade financeira, surgiram ainda em debate as condições e as motivações por trás dos trabalhos dos estudantes. Para muitos destes jovens, seria ideal conseguir conciliar a sua necessidade de ganhar dinheiro com um emprego na sua área de formação que os pudesse valorizar, e fazê-los aplicar as suas aprendizagens, o que generalizadamente não acontece devido, entre outros fatores, à incompatibilidade horária que ambos os cenários requerem.
Lara Vaz, jovem brasileira a fazer um programa de “Trabalho Férias” em Paris, defende que devíamos pensar que tipo de trabalho poderia, de facto, ser benéfico para um estudante. ”Podia ser um trabalho que não fosse apenas um meio para gerar alguma riqueza, mas que também contribuísse de outra forma para a comunidade”, sugere.
Aqui, Beatriz Lourenço, trabalhadora-estudante em Copenhaga, tem outra opinião: “quando vamos a um restaurante na Dinamarca quase todos os trabalhadores são estudantes”, explica. “Aliás, sendo estrangeiro, para conseguirmos uma bolsa do Estado para estudar temos que trabalhar, e acho que não há nada de mal em trabalhar num restaurante enquanto estudante, até porque tudo o que seja competências de comunicação é super desenvolvido quando se trabalha em atendimento ao cliente, o que promove a nossa independência”.
Dinis, outro jovem português residente em Copenhaga, acrescenta: “na Dinamarca existe um sistema que ajuda bastante os jovens a conseguir a sua independência. E é bastante fácil, muito mais fácil do que em Portugal, conseguir trabalhar e estudar ao mesmo tempo”. Neste país, condições como subsídios aos estudantes, apoio à habitação, e um horário escolar que termina diariamente entre as 15h00 e as 16h00, permitem ter mais tempo livre disponível após as aulas para trabalhar, lazer e mesmo para descansar.
Mas este não é o único país com incentivos aos estudantes trabalhadores. “Na Alemanha, por exemplo, os estudantes só trabalham em “part-time”, e muitos deles apenas ao final de semana. De segunda a sexta de manhã estão na universidade, e isso é obrigatório para todos”, explica Vasco, referindo-se ao exemplo da situação de amigos seus residentes na Alemanha.
Micael Fortes, jovem comercial residente em Paris, é da opinião de que ”o estudante poder trabalhar onde já está a estudar é muito importante.” Fala do caso particular do curso de medicina em Portugal, onde há faculdades que oferecem o estágio a partir do primeiro ano, e outras que oferecem a partir do terceiro ano. “Sei que há uma ligação entre as pessoas que abandonam o curso de medicina porque têm que estudar e trabalhar ao mesmo tempo. Estes casos, por norma, fazem o estágio logo no primeiro ano para poderem começar a trabalhar, à diferença das que esperam para fazer no terceiro ano porque já estão melhor preparadas”.
Segundo Dário, jovem participante e também facilitador do grupo, esta é a importância dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, enquanto “ideias que nos direcionam para um mundo mais justo”. Estes objetivos, também discutidos pelos jovens ao longo da semana nas várias atividades e ateliers facilitados, encontram-se espalhados e ilustrados por todo o Centro da Juventude de Braga, relembrando valores e espelhando preocupações e motivações destes jovens que, tais como outras centenas que mensalmente cá passam, partilham as mesmas ansiedades, sonhos e preocupações enquanto ao seu futuro. O seu compromisso é agir em direção a um mundo mais igualitário e justo. Falta agora cumprir Portugal.