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Os perigos da extrema direita para os portugueses em França

A decisão de Emanuel Macron de convocar eleições legislativas antecipadas pode ser vista como um decalque da precipitação do então primeiro-ministro David Cameron em 2016, que fez um referendo que levou à saída do Reino Unido da União Europeia. Tal como a consequência foi muito negativa para o Reino Unido e para a União Europeia, agora as coisas repetem-se. Em ambos os casos, a decisão foi tomada pelo acosso da extrema-direita, sendo hoje visível como a decisão atingiu muito negativamente o Reino Unido económica, social e politicamente, incluindo com maior isolamento internacional.

Macron foi vítima da sua própria estratégia e arrastou nela o país. Quando decidiu abandonar o Governo de François Hollande, foi com a ideia de fazer o seu próprio caminho, colocando-se acima da direita e da esquerda, o que levou a um completo esvaziamento do centro político em França. O resultado é aquilo que hoje vemos, de um país entregue aos extremos, à direita e à esquerda, em conflito permanente e com receio recorrente do agravamento da turbulência social. Tanto no caso britânico como no francês, as questões em torno de temas como a União Europeia e a imigração estiveram sempre presentes e serviram de motor para amplificar os descontentamentos.

Não admira que a tragédia que hoje vive o Reino Unido em que muitos britânicos se arrependem de ter votado pela saída da União Europeia, possa vir a ter uma situação equivalente em França, tendo em conta a possibilidade do Rassemblement National da dinastia Le Pen e agora de Jordan Bardella obter uma maioria absoluta ou conseguir governar com o apoio dos Republicanos, que nestas eleições quase se tornaram insignificantes.

E esta situação que hoje se vive em França, em que, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, a extrema-direita pode aceder ao poder, é altamente preocupante para a enorme e muito integrada comunidade portuguesa, composta de algumas centenas de milhar de binacionais.

A extrema-direita tem vindo a fazer um grande esforço de normalização para não meter medo aos eleitores e ser aceite. Mas o seu ADN nacionalista, anti-europeu, xenófobo, contra os migrantes e as minorias está lá. Como está a sua ligação à Rússia de Putin. E quanto maior for a força que consegue por via dos votos, mais confiança sentirá para se afirmar sem ocultar as suas ideias mais polémicas que fragilizam a coesão da sociedade e a solidez da democracia. 

Tal como já tinha acontecido recentemente a propósito da lei da imigração, a extrema-direita introduziu no debate público algumas propostas que são ofensivas para as centenas de milhar de portugueses e outros cidadãos com dupla nacionalidade, que constam da sua proposta de lei sobre cidadania, identidade e imigração. O que lá está é assustador. Não se trata apenas de tornar mais difícil o acesso à nacionalidade de quem vive em França há dezenas de anos e de tornar mais fácil a sua perda e expulsão do país, é também a preferência nacional que pretere os estrangeiros, incluindo da União Europeia, no acesso a empregos na administração e altos cargos em entidades públicas. Há também quem defenda que o exercício de funções de governação ou de eleição devia ser vedado aos cidadãos que têm dupla nacionalidade. Estas propostas dão calafrios só de pensar nas centenas de milhar de portugueses que poderiam ser afetados por uma lei destas.

Vale a pena transcrever um excerto do artigo 4. 1. da referida proposta de lei: “De forma a garantir aos franceses, em todas as circunstâncias, uma prioridade no acesso ao emprego, em igualdade de méritos, no setor privado e, no caso presente, no setor público, bem como no benefício da ação dos serviços públicos e das políticas públicas, incluindo a habitação, a lei limita o acesso aos estrangeiros”. Claro como água. Uma vergonha.

Paulo Pisco

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