E se o português fosse mais uma das línguas de Espanha?
“A língua portuguesa poderia alcançar o reconhecimento como uma das línguas de Espanha, de uso minoritário, mas de carácter ancestral”, defende Pablo Castro Abad.
Castro Abad é um iberista convicto que dirige um grupo que defende a união de Portugal e Espanha e faz parte do grupo que lançou a revista Trapézio, uma publicação digital dirigida às comunidades de língua espanhola e de língua portuguesa, “cujo objectivo é criar uma opinião pública Ibérica, consciente da existência de barreiras administrativas e linguísticas peninsulares que queremos ajudar a levantar”.
O professor universitário e ativista considera que a Constituição Espanhola, no seu artigo 3.3. determina que “a riqueza das diferentes modalidades linguísticas da Espanha é um património cultural que será objeto de especial respeito e proteção”. Na sequência do artigo constitucional, o Estatuto de Autonomia da Comunidade Autónoma da Estremadura no seu artigo 9º estabelece como competência exclusiva a Protecção das suas próprias modalidades linguísticas, que segundo os relatórios linguísticos existentes são: “A fala, extremeñu e português arranhado”.
Estes últimos, segundo o professor Carrasco González da Universidade da Extremadura, citado por Castro Abad, podem ser divididos em três subgrupos. Por um lado, o Ferrereño (Herrera de Alcántara); uma forma arcaica de português proveniente de colonos portugueses no século XIII. Outra modalidade mais moderna, com origem no século XVIII, é falada nos bairros limítrofes de Valência, Alcántara e La Codosera. Por fim, temos o mais conhecido português alentejano de Olivença.
Assim, conclui Pablo Castro Abad, “a língua portuguesa é falada na Estremadura desde a sua constituição como entidade territorial regional no final da Idade Média. Isto, juntamente com a circunstância contemporânea da região de Olivença, leva a concluir que a língua portuguesa é uma língua específica da Estremadura e, portanto, de Espanha. É certamente uma língua falada como minoria, mas se, aos falantes tradicionais, somarmos os estudantes de português como língua internacional, o número já é significativo”.
E considera que a iniciativa daria reconhecimento legal à língua portuguesa na sua variedade limítrofe, “o que permitiria colocá-la ao nível de outras línguas de Espanha como o bable, o leonês ou o aragonês, que não são oficiais, mas são reconhecidos como seus estatutariamente”.
“Considerar o português como uma das línguas da Espanha teria um valor importante”, insiste, pois completaria o panorama linguístico de Espanha, “tão debatido e tantas vezes controverso, incorporando no património cultural espanhol uma língua universal, de puras raízes ibéricas”.
Espanha já faz parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa como país observador, questão que foi impulsionada pela proximidade que a língua galega tem com o português. No entanto, o galego é normativamente uma língua diferente do português.
Uma das consequências práticas do reconhecimento, preconizado pela Iniciativa Legislativa Popular, implicaria a possibilidade de utilização do português no Congresso espanhol, desde que o orador autotraduzisse a sua intervenção para espanhol, como já acontece com os congressistas que intervêm no Aragonês, Bable. ou Aranês. Outra possibilidade que se abre é incluir o português numa disciplina nas escolas denominada “línguas de Espanha” ou “línguas ibéricas”.
A maior utilização do português em Espanha favoreceria a intercompreensão que “é, na minha opinião, fundamental para articular linguisticamente um espaço geoestratégico iberófono que reúna as comunidades lusófonas e espanholas. Com isto combateríamos dinâmicas que por vezes levam espanhóis e portugueses a recorrer ao inglês para se entenderem”, afirma Castro Abad.
“Infelizmente, o debate sobre as línguas em Espanha não é um assunto pacífico; Temos de ser inteligentes e não fazer da riqueza linguística um problema. A obrigatoriedade não é a forma de proteger as línguas co-oficiais. A promoção do uso e preservação do catalão ou do galego não deve contradizer o valor de ter uma língua comum e universal como o espanhol. Encontrar o português limítrofe na riqueza linguística de Espanha é, no entanto, um tesouro até então escondido, que devemos aproveitar para promover a língua de Camões, deixando de considerá-la estrangeira”, conclui.