Relações comerciais Portugal-Brasil “estão no bom caminho”
Segundo Otacílio Soares, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira (CCILB), “as oportunidades entre Brasil e Portugal no campo comercial são vastas e diversificadas, especialmente à luz das transformações económicas globais e das iniciativas bilaterais”.
“Ambos os países têm explorado setores estratégicos, com destaque para tecnologia, energias renováveis, agroindústria e economia digital. No Brasil, o agronegócio continua a ser uma potência, e Portugal, com a sua localização estratégica na União Europeia, pode se tornar num hub essencial para a exportação de produtos brasileiros para mercados europeus e além. Além disso, temos visto um grande interesse por parte de empresas portuguesas em investir no Brasil, principalmente em áreas como infraestrutura, mobilidade urbana e projetos de sustentabilidade”, defendeu este responsável.
Outro setor em crescimento, de acordo com Otacílio, “é o da inovação tecnológica e startups”.
“Portugal tem-se destacado como um polo de inovação na Europa, com eventos globais como o Web Summit, e isso atrai cada vez mais empreendedores brasileiros que buscam um ambiente propício para desenvolver as suas ideias e expandir as suas empresas internacionalmente. Da mesma forma, empresas portuguesas encontram no Brasil um grande potencial de expansão, especialmente em áreas como tecnologias de informação, energias renováveis e turismo”, sublinhou.
Esta interação será reforçada, nos próximos dias, por uma intensa agenda empresarial focada nas startups que vai ter lugar em paralelo à edição do Web Summit Lisboa, entre os dias 11 e 14 de novembro. Uma dessas experiências será liderada pelo escritório europeu da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (FUNCEX Europa), que vai realizar o “Matchmaking Day”, no dia 13 de novembro, nas instalações do DNA Cascais, com o apoio da Câmara Municipal de Cascais, com o objetivo de “apoiar o desenvolvimento do comércio exterior brasileiro, em especial a partir de Portugal para toda a Europa e para os países da CPLP”, no âmbito do apoio à missão da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), especificamente para o evento de tecnologia na capital portuguesa.
“A WebSummit Lisboa é um evento estratégico para mostrarmos ao mundo o Brasil como celeiro de inovação e a ApexBrasil está levando a maior delegação brasileira da história para o evento, oferecendo trilhas de preparação para que tenham os melhores resultados possíveis em Lisboa”, comentou Ana Paula Repezza, diretora de Negócios da ApexBrasil.
Prova desse esforço passa pelo raio-x do balanço comercial entre Brasil e Portugal, que tem apresentado um crescimento significativo nos últimos anos, mas com um enorme potencial ainda a ser explorado. Em 2023, o Brasil registou um superávit recorde de cerca de US$ 98,84 mil milhões na balança comercial total, impulsionado principalmente pelo aumento nas exportações e pela redução nas importações.
Higor Ferro Esteves, diretor geral da Funcex Europa, avaliou que “sermos escolhidos pela APEX, pelo segundo ano consecutivo, para recebemos as startups brasileiras durante o WebSummit é um exemplo concreto desse resultado de valorização da ligação entre Brasil e Portugal”.
Este tipo de parceria, envolvendo entidades, associações e Câmaras de Comércio e Indústria, têm acontecido com maior frequência nos últimos anos, promovendo sinergias importantes e criando ambientes propícios de negócios em várias regiões de Portugal e, também, em solo brasileiro. Fontes do meio empresarial sustentam que “o papel das Câmaras de Comércio e das Associações Empresariais, nos dois países, é vital para aproximar empresas, governos e investidores”, através da realização de um número crescente de eventos, conferências e fóruns que “facilitam a troca de experiências, a identificação de oportunidades de negócios e a superação de desafios”, o que resulta “não apenas em acordos comerciais, mas também em parcerias estratégicas de longo prazo que contribuem para o crescimento económico sustentável de ambos os países”.
No campo da crescente conectividade aérea e marítima entre Brasil e Portugal, existem também oportunidades. É o que defende o presidente da CCILB, que comenta que, “tanto o turismo quanto o comércio de bens e serviços estão em uma trajetória ascendente”.
“Portugal tem sido um destino cada vez mais procurado pelos turistas brasileiros, e o Brasil também se apresenta como uma excelente oportunidade para investidores portugueses no setor hoteleiro e de turismo, além de oferecer um mercado consumidor de grande dimensão”, confirmou.
Existe, num formato natural, uma maior aproximação entre Brasil e Portugal em vários níveis, incluindo o campo diplomático. As duas nações mostram-se alinhadas em diversos temas e em diversas pautas internacionais. Esta conjugação só não é maior pelo facto de haver entraves no tão esperado acordo entre a União Europeia e o Mercosul. Estes dois blocos económicos, dissonantes no que toca ao setor do agro e da proteção ambiental, por exemplo, poderiam, para os especialistas, potencializar a expressão comercial de um país continental, que é o Brasil, e a importância geoestratégica de ser Portugal uma porta de entrada para a Europa. Quem sairia a ganhar também neste quesito seriam os países que integram a CPLP.
“O relacionamento entre a União Europeia e o Mercosul tem sido um dos temas mais debatidos nos últimos anos, especialmente após o anúncio do acordo comercial entre os blocos. Embora o processo de ratificação tenha enfrentado obstáculos e desafios, o acordo representa uma grande oportunidade de integração e fortalecimento de laços comerciais. Este acordo, quando plenamente implementado, pode trazer benefícios significativos para ambos os lados, promovendo a eliminação de barreiras comerciais, o aumento do fluxo de investimentos e a cooperação em áreas fundamentais como meio ambiente, inovação e sustentabilidade”, confirmou Otacílio, que recorda, no entanto, que “não podemos ignorar que existem questões complexas a serem resolvidas, como a sustentabilidade ambiental, em particular, tem sido uma área de debate central nas negociações, com a União Europeia colocando uma ênfase crescente na proteção ambiental e no combate às mudanças climáticas”.
“Esta é uma área onde o diálogo precisa continuar, e acredito que o Mercosul, incluindo o Brasil, está disposto a cooperar para encontrar soluções equilibradas que atendam às necessidades de ambas as partes. Apesar dos desafios, acredito que os dois blocos estão mais conectados do que afastados, e há um esforço contínuo de ambos os lados para manter o diálogo aberto e produtivo. A União Europeia reconhece a importância do Mercosul como um parceiro estratégico, tanto em termos comerciais quanto geopolíticos, e o Mercosul também entende a relevância de fortalecer as suas relações com um dos maiores blocos económicos do mundo. Estamos em um momento de transição, e acredito que, com diplomacia, diálogo e boa vontade, podemos avançar em direção a uma cooperação ainda mais sólida no futuro”, disse Otacílio.
Mas nem sempre é fácil encontrar o tom certo na adaptação aos novos mercados e formatos de empreender nos dois países. Em declarações à nossa reportagem, Sónia Crisóstomo, empresária e integrante do Clube de Mulheres Empreendedoras de Portugal e do Business Club do World Trade Center em Lisboa, explica que as maiores dificuldades que os empreendedores enfrentam ao investir em Portugal “é a falta de informação, de conhecimento de mercado, de aculturamento dos seus produtos e soluções de serviços”.
“Costuma-se usar muito a palavra “dor” para se falar das necessidades dos clientes. E o investidor de fora, que vem para Portugal, precisa compreender que a “dor de cá” pode não ser a “dor de lá”. Produtos e serviços são criados e gerados para resolver as situações dos clientes e compreender o que o cliente quer. Isso faz parte do desafio”, afiançou Crisóstomo, que avalia que “entender a legislação portuguesa é um ponto de situação em que os empresários brasileiros devem investir tempo”.
“Quando estamos no Brasil, costumamos dizer que o nosso país é burocrático. Chegando em Portugal compreendemos que a legislação fiscal é mais desafiadora e a falta de conhecimento nessa área pode inviabilizar o negócio. Buscar profissionais contabilistas que sejam referência é um “salva-vidas””, referiu esta empresária.
Para quem decide investir num país ou noutro, embora a língua portuguesa seja considerada uma “moeda comum”, é preciso tempo para se adaptar e, sobretudo, perceber quando recuar e recomeçar.
“A afinidade cultural, a língua comum e os valores compartilhados são fatores que facilitam a colaboração e promovem um ambiente de negócios mais acolhedor e acessível. Portugal, em particular, tem se destacado como uma plataforma de entrada para o mercado europeu, com regulamentos e políticas que facilitam a instalação de empresas brasileiras, seja por meio de investimentos diretos ou por joint ventures. A interação entre Brasil e Portugal nas relações empresariais e económicas tem alcançado um novo patamar, sendo marcada por uma sinergia natural e pela disposição de ambos os países em promover um diálogo fluido e construtivo. Hoje, podemos afirmar que os laços empresariais são mais estreitos do que nunca, com um fluxo constante de investimentos bilaterais e iniciativas conjuntas em diversas áreas estratégicas”, finalizou Otacílio Soares.