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Porque são os comportamentos que determinam a evolução do COVID19

Sem saúde, não há, de facto, nada mais prioritário. Quando não estamos saudáveis biologicamente, não há nada que nos valha de valor a não ser a saúde e a vida. E são os Médicos, enfermeiros e auxiliares que, em equipa, nos hospitais, salvam vidas de quem está no estado grave ou crítico, a quem devemos reconhecer o nosso mais profundo e extraordinário agradecimento. Fora dos hospitais, onde está a esmagadora maioria, é onde se apela à responsabilidade individual para o bem colectivo. Ao fazê-lo, estamos a ajudar a que o sistema nacional de saúde não falhe connosco. Por isso, a culpa do que se passa no sistema nacional de saúde “não morre solteira” e são os comportamentos de cada um de nós que determinam o curso e as consequências da realidade que enfrentamos.

Com esta crise da saúde, e impacto social e económico que vivemos, fruto da pandemia do COVID19, o comportamento social alterou-se profundamente e é preciso colocar, sem medo, a Psicologia enquanto ciência de excelência do estudo do comportamento ao serviço das pessoas.

A ausência de compreensão do que se passa, aumenta a incerteza sobre o futuro. A zona de conforto de cada um deixou de existir em poucos dias. Neste terreno, sabemos que o desconhecido desenvolve insegurança e medo, o qual, consequentemente, desenvolve vários tipos de vulnerabilidades e riscos de comportamentos disfuncionais. Não somos talhados para sermos empurrados para o desconhecido sem preparação. A explicação do que se passa, o que é e do que provavelmente será, é fundamental para todos percebermos que o esforço temporário, vale sempre o ganho permanente. A visão de estabilidade e segurança no futuro, ajuda-nos a saber melhor o que temos de fazer agora, para compreender a situação e conquistarmos o futuro.

É essencialmente com responsabilidade individual que conseguimos desenvolver as pessoas, através da explicação e compreensão da situação, com estratégias e empowerment, para conseguirmos proteger a sociedade.

Enquanto clínico a lidar com esta realidade todos os dias em várias partes do globo, constatamos que a maioria das pessoas é bombardeada de informação, ao mesmo tempo que ingenuamente a procuram em várias fontes (na maioria partilhas entre a sua rede). Ora, isto aumenta dúvidas, receio e insegurança, assim como histórias de personalização de experiências, narrativas de conspiração, criando medos acentuados e clinicamente significativos. Outras inseguranças, mais válidas e aceitáveis, têm a ver com o isolamento social, com o tédio e aborrecimento de estarem confinados a um espaço, a ter lidar com as mesmas pessoas 24 horas por dia (com adultos e idosos, entre casais e filhos), e sobre como comunicar e esclarecer as dúvidas das crianças. Este trabalho tem sido feito, com vários vídeos e documentos em PDF, pela Ordem dos Psicólogos Portugueses, os quais recomendo vivamente consultar, pela sua sustentabilidade clínica e científica.

A investigação recente demonstra que stress, solidão e insónia são sintomas que fragilizam o sistema imunitário e facilitam o risco de infecção por coronavirus. Importa, por isso, ter consciência que as rotinas são fundamentais. Deitar e acordar a horas, horários habituais das refeições, actividade física e actividades que façam sentir útil e planeamento de actividades ao dia é crucial para reduzir riscos de vulnerabilidade à doença física e mental.  É preciso fazer higiene mental, para manter a saúde mental neste momento. Nesse sentido, a partilha das informações que nos chegam nestes tempos de insegurança e dúvida, fora das fontes oficiais, mesmo sendo com a melhor das intenções, não é benéfica para nós. Por exemplo, e pensemos juntos: os casos que estão internados nos hospitais são sempre aqueles onde é esperado ter relatos e experiências mais dramáticas, pois é para estes locais que se afunilam os casos graves ou críticos que tanta ajuda precisam dos nossos médicos. A consciência da gravidade da situação é importante, mas se a informação for excessiva, acabamos por sofrer mais risco de ansiedade social, comportamentos anti-sociais e inclusivé pânico, para além da aumentar o risco de contrair o COVID19 por fragilidade do sistema imunitário.

A este propósito, permitam-me que seja claro sobre o que é efectivamente tóxico para aumentar a vulnerabilidade ao medo, insegurança, ansiedade e risco de perturbações de saúde mental:

1) o excesso de informação de fontes não oficiais para além das oficiais
2) o acesso a informação sem compreensão
3) a informação excessiva sobre assuntos ou situações que não há capacidade de execução

Saber comunicar e responsabilizar por comportamentos individuais é crucial neste momento!

Se o foco da mensagem na comunicação entre as pessoas são apenas as consequências do que têm de aceitar, sem compreender o Poder que têm para agir, o resultado será sempre, quer queiramos quer não, mais sofrimento e desorganização pessoal e social.

Porquê? Porque a comunicação, sendo feita de palavras, é o que permite construir as histórias que contamos a nós próprios e aos outros. E, estas histórias, têm um impacto emocional, devido à qualidade das palavras que usamos. Assim, quanto mais a comunicação estiver ancorada no que cada um pode fazer, mais conseguimos conquistar a mudança de comportamentos que queremos, porque aumenta o sentido de responsabilidade individual, e consequentemente, a segurança e confiança. Dito de outra forma, quando assumimos a mudança nos nossos comportamentos e nos responsabilizamos, temos poder de acção sobre o nosso mundo.

Enquanto cidadãos, cada um de nós tem de contribuir para a adaptação de novos comportamentos para abrandar a inevitável propagação do COVID19, pois sabemos que a curva epidemiológica depende dos comportamentos de cada Pessoa. Ora, sem responsabilidade individual não temos competências pessoais para sabermos funcionar em sociedade, o que só alimenta a irresponsabilidade, a insegurança, o egoísmo e a instabilidade social, assim como, no seu estado mais grave, o desrespeito até à anarquia. Ao mesmo tempo, sem a responsabilidade individual criamos a falácia de que somos vítimas e ficando dependentes de terceiros ou do Estado, incapacidades de cuidar de nós próprios, ficando facilmente ofendidos e agressivos. Adicionalmente, cria-se a distorcida ideia de que a responsabilidade começa nos outros como um direito adquirido para nos dar o que “merecemos”, criticando todo e qualquer Poder instalado dos seus próprios problemas, facilitando a centralização de poder e não a distribuição do mesmo.

Assim, precisamos continuar a atrasar a quantidade de pessoas infectadas com o vírus, pois o que está em causa, não é a gravidade da doença (porque a maioria recupera), mas sim a quantidade de pessoas que fica doente ao mesmo tempo. Acresce ainda que o risco maior é nos casos graves ou críticos, pois os médicos poderão não conseguir salvar as vidas de todos ao mesmo tempo, por sobrelotação e incapacidade de resposta do Sistema Nacional de Saúde. O que se pretende com o apelo à responsabilidade individual para o cumprimento das medidas de auto-protecção, o Estado de Emergência imposto e a quarentena obrigatória para infectados, é garantir o abrandamento da forma como o vírus se propaga e dar resposta no limite da eficácia do Sistema Nacional de Saúde. Tudo para que que se continuem a salvar vidas nos hospitais. Somos nós que transmitimos os vírus. Somos nós que temos o poder de o travar. E se gostamos das pessoas à nossa volta e de viver em sociedade, neste momento, o isolamento social presencial/ físico é a melhor forma de mostar o nosso afecto e cidadania.

Para além destes aspectos de responsabilidade individual, há também, claro, a responsabilidade do Poder Político, Governativo e da Europa, para proteger a economia do mercado. Sem responsabilidade colectiva consciente de quem tem este Poder, teremos não só a actual crise sanitária, mas também um agravamento da crise económica e social nacional e mundial, à semelhança do impacto de uma guerra mundial. Não sendo uma economia rica, Portugal não pode dar-se ao luxo de não pegar no problema de frente, com capacidade de decisão e liderança para inspirar confiança no futuro, para evitar o dramático impacto em centenas de empresas, deixando milhares de pessoas desempregadas. É preciso também aqui, em termos de economia comportamental, que a Comunicação do Governo seja clara e simples com as empresas, e lhes transmita segurança e actos de que estão a fazer o impossível para proteger a sustentabilidade as empresas e o futuro de Portugal. É preciso que aos empresários lhes sejam reduzidos os medos do futuro, para continuarem a acreditar em si próprios e aguentarem passar uma realidade muito dura, pois são eles que criam empregos, pagam salários e sustentam famílias. É preciso acreditar que vamos continuar a navegar depois da tempestade, para manter a coesão familiar e criar um novo equilíbrio social e económico.

Nada na vida é garantido, pelo que quem não cuida do que tem, perde. Quanto mais controlarmos as variáveis que temos poder de execução, mais seremos consistentes nos comportamentos responsáveis, menos ansiosos ficaremos, e mais lideramos o futuro individual e colectivo de uma sociedade que se pretende próspera e feliz. Isto é ser maduro, pois maturidade é uma característica própria do carácter de quem assume a responsabilidade dos seus actos.

Mudamos sempre pelo que escolhemos fazer ou não fazer. Nesse sentido, a natureza humana parece que ainda precisa aumentar a consciência e responsabilidade para amadurecer…

Ivandro Soares Monteiro
Psicólogo Clínico / Psicoterapeuta (em Portugal ou Online)
Executive Coach / Consultor Comportamental
Fundador & CEO da EME Saúde

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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