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O homem domesticado

Nuno Gomes Garcia é um escritor português radicado em França. Com várias obras publicadas, nomeadamente; O Soldado Sabino, 2012; o dia em que o sol se apagou, finalista do premio Leya 2015; Zalatune, 2017. Com características narrativas de uma distopia “O homem domesticado” é uma abordagem social e irónica à dominação masculina nas sociedades. O termo foi popularizado pelo filósofo John Stuart Mill em 1868, e significa o oposto de utopia. Stuart Mill afirmou que “o que é demasiado bom para ser tentado é utópico, o demasiado mau é distópico”.

O romance de Nuno Gomes Garcia desenrola-se num registo literário distópico no sentido em que todo o percurso narrativo nos apresenta um universo paralelo, criado para nos mostrar o que de pior há na humanidade. Para além da representação dos estereótipos de género, também estão, claramente, representados os vícios dos homens. A ambição, o ciúme, o suborno. Para juntar a este leque de características humanas, este romance alerta para os perigos da desumanização do homem, o excessivo e perversivo uso da ciência, a manipulação genética.

O romance começa pela descrição da cena que será o desfecho da narrativa. Nas margens do Rio sena, na cidade de Paris, num tempo que se quer seja bastante longínquo no futuro, um homem é enforcado e os homens da cidade obrigados a contemplar o cadáver que se deteriora aos olhos de todos. A mensagem é clara: “Uma má conduta termina sempre com o prevaricador pendurado na ponta de uma corda”, Ou seja; “se não queres acabar assim segue as leis que imperam.”

A narrativa evolui com avanços e recuos no tempo. Com prolepses e analepses. Este recurso estilístico põe-nos perante um exercício de equilíbrio e desequilíbrio, de uma tentativa de adivinhação sobre o percurso dos personagens nos espaços vazios que separam a narrativa. Avanços e recuos que dão sentido ao desequilíbrio dos personagens. Num exercício de indícios que darão posteriormente as respostas, bem ao jeito, dos detetives e dos filmes policiais.

Francine, Pierre e Gean são o triângulo amoroso dos protagonistas do romance. Francine é casada com Pierre, o qual não consegue dar “semente” para gerar um filho é obrigado a ser substituído por outro macho. Francine escolhe um com características diferentes do padrão.

O romance, O homem domesticado, coloca-nos perante realidades já conhecidas, mas no sentido inverso. É um romance que nos leva a imensos questionamentos. Questionamentos, morais, éticos sociais e humanos.

Para onde nos leva os avanços da ciência e da tecnologia de ponta?

Como seria um mundo onde apenas um dos géneros tivesse o poder e subjugar, manipular o outro aos seus desejos? Que limites a ter no que diz respeito à liberdade humana?

Que humanidade estaremos a criar para o futuro?

O homem domesticado é um romance escrito com uma linguagem bastante acessível, no entanto, podemos encontrar nele, não só, perguntas essenciais para nos posicionarmos perante no futuro, mas também, questionamentos para o que poderá ser perigoso numa sociedade totalitária. Regimes totalitários, vigiados, pessoas constantemente controladas nos seus atos mais banais do quotidiano. Homens e mulheres padronizados. A busca incessante de uma raça uniforme. Este romance pode ler-se com uma sátira ao presente e a algumas práticas sociais nas sociedades atuais. Mulheres completamente subjugadas ao poder dos homens através da repressão e do medo. Mulheres que não podem sair à rua de cabeça destapada. Esta obra pode servir como alerta sobre: em como se transformaria a humanidade quando, na busca incessante da pureza de raça, se tenta a todo o custo suprimir os afetos, as relações carnais, erradicar a dor física.

Um livro a ser lido. A repensar nos conceitos de equilíbrio e desequilíbrio. Preconceitos e estereótipos, limites e liberdades. Totalitarismo e manipulação.

São Gonçalves

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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