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Notre-Dame: porque é crucial recuperar símbolos de estrutura social

Neste domingo, 8 de dezembro de 2024, a Catedral de Notre-Dame reabre as suas portas ao público após uma recuperação extraordinária que uniu pessoas e empresas num investimento 700 milhões de euros, numa cerimónia que reúne figuras de Estado, com 40 chefes de Estado e de Governo, membros da realeza europeia e figuras políticas proeminentes, como o futuro Donald Trump e o Presidente Ucraniano Volodymyr Zelensky. Assim, com tanta gente de famílias políticas e ideológicas diferentes entre si, esta união representa a recuperação de um símbolo social que a grande maioria quer marcar de forma significativa e não seja esquecido. 

Mais do que um evento solene, este marco levanta questões profundas sobre a importância dos símbolos na estruturação da nossa sociedade. Enquanto psicólogo clínico e professor universitário, e tendo eu já leccionado durante vários anos a disciplina de “História da Psicologia”, cuja origem vem da filosofia, tão crucial para a nossa vida, fascina-me refletir sobre as crenças que moldam as civilizações e a forma como estas influenciam o nosso modo de vida atual.

A Catedral de Notre-Dame é muito mais do que um monumento arquitetónico. Construída no século XII, esta catedral tem servido de ponto de referência cultural, espiritual e social. Representa um eixo de continuidade, mesmo para aqueles que não se identificam com crenças religiosas. Simboliza a capacidade humana de construir, preservar e reerguer-se após adversidades, como ficou claro após o devastador incêndio de 2019. A sua restauração reflete a importância de mantermos estruturas que, além de serem marcos históricos, sustentam as narrativas que orientam as nossas vidas no mundo ocidental, como símbolos do património da humanidade.

Vivemos numa época em que muitas referências tradicionais estão a ser questionadas ou abandonadas, cuja função disruptiva é importante para continuarmos a evoluir enquanto pessoas e civilização.

Contudo, com os telemóveis e tecnologias e acesso ao mundo e pouco tempo de qualidade de interacção, vemos Pais que hesitam em educar, confundindo dar estrutura com imposição de preconceitos. Com isso, vemos jovens crescerem sem modelos claros, perdidos num mar de informações contraditórias, validadas por algoritmos. 

Esta falta de referências não significa liberdade, mas sim desorientação. Independentemente de sermos crentes ou não, todos vivemos com crenças e axiomas que moldam a nossa existência. Muitos de nós somos católicos não crentes sem saber porque os valores que sustentam os comportamentos são claramente de base religiosa acumulada ao longo dos séculos. Mesmo aqueles que se declaram ateus ou agnósticos não escapam a valores profundamente influenciados pela história religiosa, como por exemplo a forma como idealizamos o amor. Infelizmente, esta idealização muitas vezes confunde amor com posse, levando a comportamentos tóxicos, como a violência doméstica que tantas vítimas causam ainda nos dias de hoje como um sério problema de saúde pública.

Sem entender as crenças, não se mudam comportamentos de forma genuína.

Se queremos mudar o mundo, precisamos primeiro compreendê-lo. As estruturas sociais, tal como a Catedral de Notre-Dame, não são apenas testemunhos do passado, mas também pilares para a construção do futuro. Estas estruturas lembram-nos da importância de hierarquias de competência, empoderamento e responsabilidade, essenciais para a transformação social. Mudanças radicais e abruptas muitas vezes causam fragmentação; por outro lado, mudanças graduais permitem que as pessoas lidem com o desconforto próprio do crescimento e da nossa evolução e maturidade. Como defendia o meu colega Viktor Frankl é fundamental dar sentido ao sofrimento para amadurecer.

A reabertura da Catedral de Notre-Dame é muito mais do que uma abertura de portas de uma igreja. É o que não se vê que conta neste gesto. É um convite à reflexão sobre o valor dos símbolos. Representa a resiliência e a capacidade de uma comunidade em reconstruir-se, preservando o essencial da sua história enquanto abraça o futuro. Num mundo em que tendemos a esquecer rápido e a descartar o que não nos serve no imediato, Notre-Dame relembra-nos que somos parte de algo maior. Recuperar uma catedral é também recuperar um pouco de nós mesmos e da nossa humanidade para alcançar novos patamares de desenvolvimento social e civilizacional.

No final, compreender a história, respeitar as estruturas e fomentar a responsabilidade individual são passos cruciais para uma sociedade mais equilibrada. A Catedral de Notre-Dame é um lembrete de que o progresso não significa apagar o passado, mas sim construir sobre ele, com tolerância, resiliência e visão.

A mudança do mundo começa na atitude de cada um de nós. Nunca nos outros.

Quer mudar o mundo? Entre nele, entenda-no, mostre competência, influencie e mostre o que vai acrescentar de valor aos outros. Daí que o poder traga sempre grande responsabilidade, coragem, gratidão e humildade.  

Um abraço estóico,
Ivandro Soares Monteiro
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta doutorado @EME_Saude

Psicólogo das Organizações e Consultor Comportamental @Crowe
Professor Universitário @icbas

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