«Estou a morrer. Na solidão de um quarto humilde, de paredes despidas. Conheci o poder, acreditava dominar este mundo e o outro. Julgava poder sair da minha pele, remando contra a maré, dando vazio à ânsia indomável que me consumia. Venci vagas e julguei-me invencível, mesmo quando novas surgiam, cada vez mais altas, atiçadas por vento impiedoso, que desencorajava quem tencionava ajudar-me.”
“Memórias de Dona Teresa” é um romance histórico onde a escritora Cristina Torrão narra os últimos dias de vida daquela que foi mãe de D. Afonso Henriques e a primeira mulher a governar o que foi o início da fundação de Portugal.
Como se sentirá esta mulher que teve nas mãos tanto poder? Que foi amada e odiada por tantos e com a mesma intensidade? Como desapegar-se da vida e dos seus, sem sentir um sentimento de dor e de culpa pelos males cometidos, pelos erros e pelas omissões? Quem terá sido, então, esta mulher?
É num tom confessional que Cristina Torrão vai dar voz a Dona Teresa. Despojada de tudo, contudo, mantendo uma lucidez de espírito muito aguda, Dona Teresa revisita a sua vida, desde a infância, até estes dias. O dia em que a levaram da casa de sua mãe, o casamento com o conde Dom Henrique, o nascimento e morte de alguns filhos, a alegria da maternidade das filhas e do filho que viria a ser o fundador de Portugal. A viuvez e a consequente tomada de poder na condução do reino.
Cristina Torrão quis com este romance dar voz a uma mulher, que vivendo na idade média, num sistema completamente patriarcal e dominado pelo poder masculino, soube assumir o seu papel na condução do reino, tomar mediadas e posições, enfrentar a família e adversários, pagando muitas vezes um preço demasiado alto. O preço da desacreditação, da solidão e sobretudo o preço da maldade dos outros.
Esta será mais uma versão da história de Dona Teresa, juntando a tantas outras, fictícias ou verdadeiras que se foram criando ao longo dos séculos. No entanto, não deixa de ser uma narrativa que pretende desmistificar e contrariar a tendência de desacreditar a força das mulheres num ambiente tão hostil para elas, como foi a vida na corte no tempo das conquistas.
Dona Teresa foi uma mulher corajosa e forte, amou e foi odiada, teve todo o poder em vida, e morreu num quarto com paredes despidas, portanto, na mais perfeita humildade.