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Dia da Catalunha: um ano depois, o que aconteceu e o que podemos esperar?

Celebra-se hoje a Grande Diada do Onze de Setembro em Barcelona, o feriado nacional que é um dos três símbolos da nação da Catalunha, a par da bandeira e do hino “Els Segadors”. Há um ano atrás a Diada decorrida no rescaldo do atentado nas Ramblas deixava antecipar uma grande mobilização e expectativa para o referendo pela autodeterminação da Catalunha que haveria de se realizar a 1 de Outubro, debaixo de um forte dispositivo policial da Guarda Civil espanhola.

Um ano depois, o que aconteceu? Que progressos foram feitos? Quais os marcos principais e o que fica desta história mal contada, com má imprensa e repleta de processos judiciais inauditos numa democracia teoricamente madura e consolidada?

1. A repressão do Estado Espanhol fomentou o independentismo entre pessoas que não eram independentistas;

2. A prisão de líderes políticos vulnerabilizou a saúde do Estado de Direito e a percepção da comunidade internacional sobre Espanha;

3. Os resultados do referendo não vinculante de 1 de Outubro que levaram à simbólica declaração de independência da Catalunha a 27 de outubro conduziram à imposição do Artigo 155º da Constituição Espanhola, deixando assim as instituições catalãs reféns do controlo e domínio administrativo de Madrid. A 21 de Dezembro haveriam de se realizar novas eleições cujos resultados reafirmaram nas urnas uma nova maioria parlamentar independentista, apesar das condições anormais em que a campanha decorreu com candidatos na prisão e no exílio;

4. O exílio de Puigdemont e dos conselheiros do Governo Regional ampliou a causa independentista no espaço europeu e levou o conflito para os tribunais de países como a Bélgica, Suíça e Alemanha. As decisões jurídicas destes árbitros externos colocaram em causa a isenção e separação de poderes dos órgãos de soberania espanhóis;

5. A deriva autoritária do PP que motivou as agressões físicas a mulheres e idosos, processamento de dirigentes e manifestantes veio agudizar a fratura social na sociedade catalã – uma ideia endurecida e maximizada pelo Ciudadanos, que aproveitou esta oportunidade para dilatar o seu espaço mediático e reforçar-se nas intenções de voto;

6. A fragilidade de Mariano Rajoy em conseguir fazer passar o Orçamento no Congresso, fruto da dependência dos nacionalistas bascos, os sucessivos escândalos de corrupção e abuso de poder no seio do partido popular e por fim a moção de censura do PSOE, suportada pelo Podemos e pelas demais forças política levaram à queda dos populares e catapultaram o PSOE de Pedro Sánchez para o governo da Moncloa.

7. A ascenção fulminante de Pedro Sánchez no governo cumpriu um propósito duplo: abrir espaço para que os socialistas pudessem desempenhar um papel ativo na gestão da questão catalã e assim crescer nas intenções de voto estancando provisoriamente a intenção de voto no Ciudadanos, que tem vindo progressivamente a reforçar a deriva nacionalista. Por outro lado, a chegada do PSOE à Moncloa contribuiu também para fazer decrescer (ainda que ligeiramente) a crispação entre governos e abrir uma nova janela para o diálogo, que até ver não se traduziu em resultados concretos – a saber, a libertação dos presos políticos, a amnistia dos exilados e o acordo para um referendo pactado para a auto-determinação e independência da Catalunha.

Chegados a este ponto, a Diada do 11 de Setembro de 2018 é assim mais um momento chave no processo independentista. Sob o lema “Fazemos a República”, esta multitudinária manifestação é simultaneamente uma prova de fogo à resiliência do movimento – o sucesso ou fracasso da mobilização ditará a legitimidade e respaldo democrático que o Governo Interno de Quim Torra e o recém-constituído Conselho da República em Waterloo liderado por Carles Puidgemont poderá empregar nas próximas etapas do processo largo rumo à independência da Catalunha.

Seja como for, as guerras internas dentro do Partido Popular já levaram ao afastamento de Mariano Rajoy e mais recentemente do seu braço direito Soraya Sáenz de Santamaría, que perdeu as eleições internas para Pablo Casado.

Num plano macro, Pedro Sánchez já defendeu a ideia de que Espanha é um país plurinacional, mas a ideia de um Estado Federal com autonomia reforçada das comunidades autónomas está longe de servir às aspirações dos independentistas catalães, que ainda assim têm procurado sempre demarcar-se de outros movimentos separatistas, rejeitando a via da violência e do terrorismo.

O caminho será largo por certo, mas a ação ou inação do governo de Sánchez determinará ou não uma nova escalada no enfrentamento da via unilateral, saída do mandato de 1 de outubro. Pese embora o facto de que esta via não é consensual nem no seio das fações independentistas, a amnistia dos presos políticos e o referendo pactado para a autodeterminação da Catalunha seria o resultado ideal para pôr fim ao conflito, mas este cenário só será possível com diálogo e, acima de tudo, com vontade política para devolver a política à política.

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