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Crónicas de Lisboa: não quero morrer na praia

Quando nascemos, temos, como garantido, de que um dia a nossa passagem pela terra terá um fim. Desde crianças indefesas e que, para vencermos os primeiros anos de vida, necessitamos e dependemos dos cuidados dos adultos, a nossa luta pela vida será uma constante, pois os perigos são muitos. E neste processo da luta pela sobrevivência, até que a “morte natural” ocorra, depende muito de nós, individualmente, e do sistema de saúde (público, suportado pelos nossos impostos e privado, ao qual nem todos podem recorrer), preventivo e curativo.

Em tempos idos, o nosso país estava na cauda de muitas áreas da saúde, mas hoje, felizmente, estamos bem posicionados, pois o investimento na saúde tem crescido, mas nunca é o desejável. Só que “não há almoços grátis”, isto é, tudo que é público tem de ser pago com os impostos e estes provêm da geração de riqueza. Nesse aspeto, a nossa classificação não nos coloca no grupo dos países ricos.

Atravessamos um período crítico, o nosso pais e o Mundo, inimaginável e, de certo modo único, – sabemos que ocorreram outras “pestes” com milhões de mortes – só comparável aos efeitos duma Guerra Mundial. Apenas o património material (edifícios, infraestruturas, etc.) ainda não são muito afetados, porque na economia, no desemprego – dramático para muita gente, pois há sectores de atividade que pararam e ou estão a morrer-, nos recursos que os Estados gastam nesta guerra e que terão como consequência o crescimento do endividamento do Estado e que terá de ser pago por todos. Será uma “herança” que deixamos aos nosso filhos e netos, mas “vão-se os anéis e fiquem os dedos” ou, de outra forma, endividemo-nos para salvar vidas, estas sim as principais vítimas diretas desta guerra cuja luz ao fim do túnel começa a vislumbrar-se, mas ainda se desconhece  o comprimento desse túnel da esperança em vencermos mais uma batalha e outras até ao final desta guerra contra algo que não vemos.

Um vírus que vence na luta contra os países, por mais desenvolvidos que sejam, até enormemente preparados para as guerras reais e viagens interplanetárias, onde gastam milhões e milhões, mas que acabam por parecer uns “exércitos mal preparados” nesta guerra contra a pandemia que ataca o mundo apanhado desprevenindo. Tão entretidos andavam nas questiúnculas diversas, algumas de relevante importância como seja a Ecologia e o Ambiente em acelerada destruição, que o Covid19 se zangou e veio “por o mundo em sentido”. Obrigou-nos a todos a sermos “soldados combatentes” para defendermos a vida, a nossa e a dos outros. Só assim, numa conjugação de esforços e de comportamentos, poderemos chegar ao ponto que ambicionamos, para que a nossas vidas possam voltar a ser como o “antes Covid19”, isto é, sobrevivermos até à vacinação e à farmacologia para a cura daqueles que sejam “apanhados” por esta pandemia.

Mas viveremos, e refiro-me aos países mais ricos, como dantes? Será esse o modelo que sustentará o “estado em que ficarão” a maioria das economias do mundo? Imagine-se o que fazer com um enorme exército de desempregados provocados pela pandemia, se tanta coisa está a mexer na economia mundial e a perderem-se empregos atrás de empregos!

E os “traumas” provocados, direta ou indiretamente, por esta já longa guerra e cujos efeitos ainda não se conhecem? E o efeito, dramático, que está a exercer sobre todo ensino e também nas relações familiares e sociais?  Tudo está a ser “contagiado” pelo inimigo comum, pelo que, mesmo com informações otimistas que nos vão chegando, não poderemos “baixar armas”, quer dizer, deixarmos de agir com as “armas “que temos para lutar contra o vírus, só porque estamos “saturados” das limitações que os governantes nos impõem. Infelizmente, observam-se comportamentos e atitudes de alguns “soldados” que não se defendem nem defendem os outros, por vezes, a família, onde, diz-se, “nascem a maioria dos contágios”.

Como foi, e ainda é, possível que os residentes em “lares seniores”, muitos deles de boa qualidade e pertencentes a instituições vocacionadas para isso, tenham sido as grandes vítimas mortais desta pandemia? O que falhou ali e foram às dezenas de instituições? E nos mais pequenos e “clandestinos”, como terá sido, mas que não objetos de notícias? Sou da geração em que só os mais fortes sobrevivam aos primeiros anos de vida, porque, naquele tempo, nas décadas de 30, 40 e 50 do século XX, a mortalidade infantil e as condições socioeconómicas eram “terríveis” e inimagináveis para as gerações atuais mais novas.

Essa luta pela sobrevivência era contante e, logicamente, o corpo carregava consigo as “carências da sua fabricação” e da vida difícil e doenças sem a cura de hoje, pelo que a esperança média de vida (EMV) não tinha os índices de agora. Por exemplo, em 1960 era de 61,1 anos, nos homens, e de 66,7 anos, nas mulheres. Mas em 2018 já era de 78,3 anos, nos homens, e de 84,5 anos, nas mulheres. Graças a muitas variáveis, por exemplo, desenvolvimento socioeconómico, mas, acima de tudo, à medicina e à farmacologia, em 58 anos, eu sei do que falo, porque nasci em 1950 e vivi num mundo rural inimaginável, e mesmo urbano, para as gerações atuais, a EMV subiu 17 anos, quer para homens quer para mulheres (17,2 e 17,8 respetivamente).

Caminhávamos  e caminhamos para um “país de velhos” e com projeções para o decréscimo da população residente, pois a natalidade de Portugal é uma das mais baixas ….do mundo (em 2019 era a 5ª mais baixa da UE) e os efeitos das mortes, desta pandemia, terá consequências  no numero de portuguese e residentes, embora se veja livre de muitos “velhos” que não soube proteger. Eu estou a “meio caminho” de ser velho e, ainda por cima, sou de risco, pelo que terei de continuar a luar pela sobrevivência que já foi afetada algumas vezes, das quais saí vitorioso.

Até o teste do Covid19 já me mandaram fazer por duas vezes…, pelo que já senti o “lunático meio” (parecem “ETs” e que assusta e causa ansiedade até conhecermos o negativo…) em que a luta próxima contra o vírus se desenrola. E agora espero, ansiosamente, pela vacina prometida, (estou no grupo da primeira fase de vacinação) para acrescer às vacinas da gripe sazonal e da pneumonia que tomei, para que possa viver mais alguns anos. Sinto-me um naufrago, como milhões de pessoas por esse mundo, neste mar cheio de perigo, mas nado em direção à praia que vejo ainda lá longe. Será que vou sobreviver ou morrer na praia? Todos temos que perceber que, agora, é a vez de assumirmos um papel ainda mais “guerreiro” no combate ao Covid-19, porque seria inglório morrer na praia. E eu não quero morrer na praia….

Serafim Marques

 

 

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