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Conto de Natal

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Era uma vez, há algum tempo, num país imaginário, uma menina que não gostava nada do Natal. Ficava nervosa ao ver toda a gente atarefada nos centros comerciais a escolher prendas, a comprar braçadas de objectos que nem sequer estavam inicialmente previstos, mas que não podiam resistir ao marketing publicitário e ao “black friday”.

Insurgia-se contra o corte de pinheiros de Natal e contra a inconsciência de se não ter ainda percebido que ao cortar as árvores se destrói, irremediavelmente, o nosso planeta. Revoltava-se contra o consumo dos simpáticos lavagantes e contra os maus tratos e a tortura alimentar forçada dos gansos para se obter o “foie gras”.

Tinha decidido que não queria comprar mais vestidos. Os que tinha no guarda-fatos chegavam. Aliás, já tinha compreendido que a roupa é das coisas mais poluentes e fez a promessa de comprar tudo em lojas de segunda mão, produtos mais baratas e tão bonitas como os novos que, normalmente, até só vestia duas ou três vezes.

A Teresa, é o nome que eu lhe dou para não ser identificada, quase se culpabilizava de celebrar este Natal, ao ver as imagens de buldózeres e dos soldados israelitas a destruírem os edifícios em Gaza onde já morreram mais de 40 mil pessoas, a maior parte mulheres e crianças. Na Ucrânia o cenário é o mesmo. 

Ficou chocada ao constatar os efeitos das alterações climáticas que arrasaram ruas, casas e mataram pessoas na região de Valência. Vive assutada do que pode acontecer na terra onde vive, imaginando que pode perder os pais e os irmãos se ventos ciclónicos, tsunamis imprevistos passarem pela aldeia onde vive.

Não sabe o que há-de fazer. Adolescente e estudante pensa que não vale a pena investir-se na escola, como fazia nos primeiros anos de liceu. Está convencida de que o mundo não pode continuar assim e que irá terminar brevemente. Vive angustiada e não tem vontade de viver.

Por alturas de Natal, a Teresa recebeu a visita de sua madrinha que nunca se esquece dela nesta quadra natalícia, e, como boa psicóloga, percebeu logo que também ela tinha contraído a doença dos adolescentes que vivem stressados e sem confiança no futuro, porque só veem desgraças à sua volta. 

Convidou a afilhada a dar um passeio fora do ambiente familiar. Constatou que a Teresa já não era a mesma de alguns anos: sorridente, cheia de vida, de sonhos e de iniciativas.

À medida que passeavam, a madrinha ia falando, procurando a frase, a ideia, a palavra certa. que lhe pudesse abrir um caminho de esperança.

Instintivamente, entraram na igreja onde a Teresa tinha sido baptizada, e aproximaram-se do presépio. A madrinha e a afilhada iam contemplando em silêncio as diversas imagens que ali tinham sido colocadas e que eram uma autêntica obra de arte, tudo em terra cota. A madrinha notou que Teresa era sensível à beleza de cada figura que tinha sido concebida pela autora do presépio e percebeu quanta imaginação e trabalho tinham sido necessários para realizar o bonito presépio que agora contemplavam. 

O silêncio contaminou as duas que não deixavam de contemplar o olhar vivo do Menino Jesus que fixava Maria, sua mãe, que lhe retribuía um sorriso enternecedor, amoroso e contagiante, a ponto de Teresa ter saído do seu silencio, afirmando:

— Que mãe e que menino tão felizes!

— Este é também um momento feliz para nós duas — confirmou a madrinha. —  A contemplação sossega, dá-nos uma grande paz interior. 

A madrinha ia descrevendo os sentimentos que poderiam surgir ao olhar a simplicidade e a ternura do nascimento de uma criança. No fim, formulou o seu pensamento a propósito desta época natalícia:

— Eu penso, Teresa, que há dois natais: o Natal do consumo desenfreado que nos culpabiliza porque destrói o nosso planeta e destrói também a nossa consciência de cidadãos, e o Natal interior, o da relação com nós próprios à procura do nosso equilíbrio e paz mental, e também o da relação com os outros que amamos. Se conseguires acrescentar ainda uma outra relação com aquela que nos é transmitida por este Menino cujo nascimento os cristãos celebram, olhando com toda a confiança para Maria, sua mãe, Ele que quis trazer a salvação e a paz ao mundo, verás que mais tranquilidade e paz interior nascerão no teu coração.

Teresa escutava com muita atenção e olhava para a madrinha com todo o afecto. No fim, abraçou-a dizendo: 

— Já me sinto melhor. Será um excelente programa para este Natal e para os natais seguintes.

Joaquim Tenreira Martins

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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