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Conselheira das comunidades deixa presidência por causa do Chega

Luísa Semedo, a conselheiro eleita em França e presidente do Conselho Regional da Europa (CRE) das Comunidades Portuguesas, anunciou este fim-de-semana nas redes sociais a sua demissão do cargo de presidente daquele conselho.

Luísa Semedo apresentou a sua demissão formalmente por carta à Secretária de Estado das Comunidades, Berta Nunes, e ao Presidente do Conselho Permanente (CCP) Flávio Martins, explicando que o faz antes da reunião do CRE, explicando que o faz porque recusa encontrar o deputado do Chega, André Ventura, que considera “ilegítimo”, e “fruto de uma anomalia, de uma falha do nosso sistema democrático. O racismo, o fascismo, o nazismo, o sexismo, a homofobia não são opiniões, são crimes”.

A conselheira afirma ainda que “esta posição que emana de uma ética de convicção e que é, portanto, pessoal, não me pode fazer perder de vista a ética da responsabilidade que me obriga a ter em conta o facto de que represento enquanto Presidenta do CRE”. Apesar de abandonar a presidência do conselho europeu, Luísa Semedo afirma que continuará “como conselheira até ao fim do mandato e é nesse cargo pelo qual respondo e como cidadã que lutarei sempre, com todas as minhas forças, contra todo o tipo de visões e práticas hierarquizantes e excludentes do Outro”.

Semedo publicou a carta de demissão nas redes sociais porque não quer “que se propaguem versões excêntricas da minha demissão de hoje enquanto Presidenta do CRE-CCP (…) Os tempos que nos esperam vão ser rudes, aqui estaremos para os enfrentar. A luta continua! ✊🏾”.

Leia aqui, na íntegra, a carta de demissão de Luísa Semedo:

Exma. Sra. Secretária de Estado das Comunidades Portuguesas Berta Nunes,
Exmo. Sr. Presidente do Conselho Permanente do CCP Flávio Martins,
Exmas. e Exmos. colegas Conselheiras e Conselheiros do CRE,

Após séria reflexão, decidi com pesar, mas em consciência, demitir-me das minhas funções como Presidenta do Conselho Regional da Europa (CRE) do Conselho das Comunidades Portuguesas. Considero não reunir as condições necessárias para continuar a representar a totalidade das Conselheiras e Conselheiros deste digno órgão de representação das Comunidades portuguesas na Europa.

Aproxima-se a reunião anual do CRE e, até hoje, sempre fez parte das nossas práticas democráticas o convite a todas as Deputadas, Deputados e partidos com assento parlamentar para estarem presentes e poder haver um espaço de diálogo com as Conselheiras e Conselheiros do CRE.

Desde outubro do ano passado deu entrada na Assembleia da República um novo partido denominado Chega, representado pelo deputado André Ventura. As leis do nosso país e a nossa Constituição resultante da Revolução de 25 Abril de 1974, que arrancou Portugal das garras da ditadura e de que sempre nos orgulhámos por ser um baluarte contra o fascismo, não nos conseguiram, afinal, proteger da entrada na Casa da Democracia de quem a põe em perigo.

Considero que foi um grave erro que um personagem já conhecido pelas suas tomadas de posição racistas, tenha obtido a autorização de fundar um partido, esteja hoje na AR e pronto a disputar o lugar de Presidente da República. André Ventura representa um partido que se ataca aos direitos das mulheres, das pessoas ciganas, negras, muçulmanas, das pessoas LGBT, aos direitos dos refugiados, que propaga incitação ao ódio, que se ataca de forma descomplexada no seu programa aos valores de Abril, aos sindicatos, que tem pretensões de elaborar mudanças radicais na nossa Constituição, de implementar uma nova “República” e que abriga no seu seio fascistas e nazis.

Não lhe reconheço legitimidade, penso que é fruto de uma anomalia, de uma falha do nosso sistema democrático. O racismo, o fascismo, o nazismo, o sexismo, a homofobia não são opiniões, são crimes. Não concebo dialogar, dar legitimidade, banalizar quem defende práticas criminosas que contrariam os valores de Igualdade, Justiça e Liberdade essenciais numa Democracia.

Enquanto portuguesa, mulher, emigrante, antifascista, afrodescendente e mãe sinto-me diretamente atacada pela ideologia disseminada por este partido e pelo seu representante. O diálogo entre opiniões adversas é possível quando os interlocutores se reconhecem como Iguais. Não posso ser a anfitriã e a interlocutora de quem me considera como inferior.

Penso em prioridade a todas as portuguesas e portugueses que foram forçados a deixar Portugal para procurar Pão e Liberdade durante décadas de fascismo, de ditadura, de salazarismo. Salazar este que é adulado por notórios apoiantes do Chega. São também estas portuguesas e estes portugueses que constituem uma grande parte daqueles que representamos, e não poderia em minha alma e consciência aceitar ter como interlocutor um partido que acolhe aduladores do ditador que os obrigou a emigrar ao risco das suas próprias vidas.

Penso em prioridade a todas as portuguesas e portugueses das Comunidades que já são vítimas ou virão a ser de partidos e pessoas que defendem políticas discriminatórias e cuja visão do mundo não se coaduna com os valores de Diversidade e Igualdade, essenciais para todas e todos os que vivem fora do seu país de origem.

Penso em prioridade às nossas filhas e filhos lusodescendentes que detêm dupla nacionalidade e que poderiam também ser discriminados e incitados a serem devolvidos à sua terra por políticos que perfilham a mesma ideologia de André Ventura nos países de residência.

Esta posição que emana de uma ética de convicção e que é, portanto, pessoal, não me pode fazer perder de vista a ética da responsabilidade que me obriga a ter em conta o facto de que represento enquanto Presidenta do CRE outras visões que tenho o dever de respeitar.

Continuarei como Conselheira até ao fim do meu mandato e é nesse cargo pelo qual respondo e como cidadã que lutarei sempre, com todas as minhas forças, contra todo o tipo de visões e práticas hierarquizantes e excludentes do Outro.

Agradeço a confiança depositada em mim por todas as Conselheiras e Conselheiros que me elegeram para este cargo e é a pensar nessa confiança que também tomo esta penosa decisão. Apesar de opiniões divergentes trabalhámos sempre num ambiente fraterno caracterizado pelo respeito mútuo com vista ao Bem comum das Comunidades.

Coloco-me à vossa disposição para esclarecimentos complementares.

Com os melhores cumprimentos,
Luísa Semedo

 

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