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A casa de Sidónio Pais

Em granito, vetusta e austera, com traços arquitetónicos típicos de um tempo que caracteriza muito do património edificado de Caminha, a casa onde Sidónio Pais nasceu e viveu, na Rua Direita, tinha em si o peso da pertença àquele que, por razões da história, foi chamado Presidente-rei.

Sidónio Pais foi mais do que um político da Primeira República. Oficial de artilharia, professor universitário em Coimbra, deputado, ministro do Fomento, ministro das Finanças, ministro da Guerra, ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro presidente da República eleito por sufrágio direto e universal em Portugal, fez toda a diferença em relação à anarquia violenta que nesses tempos conturbados arrastava o país para o fundo e procurou restabelecer a ordem possível, ainda que pela via autoritária que, apesar de tudo e então, contava muitos outros exemplos pelo Mundo fora. Foi assim, até ao seu assassinato cobarde em 14 de dezembro de 1918, às mãos de um militante da Esquerda republicana. Não terá havido verão passado entre Moledo e Caminha – foram todos desde quase criança – que não tivesse parado a admirar aquela casa, bela por si, mas carregada de memória. Primeiro velha, mas sóbria e funcional. Depois, ano após ano, definhando incompreensivelmente até à decrepitude. Telhado, portas, janelas, paredes, não houve quem lhe valesse. Principalmente, não lhe valeram os poderes públicos que, infelizmente, a tiveram e têm à sua guarda.

Em 2004 foi notícia a criação da Casa-museu que recuperaria o imóvel a partir do ano seguinte, para consagração do grande estadista. Em 2017, na última Feira Medieval que a Autarquia organiza, o seu espaço serviu, entre escombros, para a instalação das casas de banho. De casa-mãe do Presidente-rei a mictório público, é obra. Diz muito da absoluta derrocada daquilo que há de mais importante num povo. Não são algumas paredes apenas. São os valores e é sobretudo a memória.

Por todo o país, em eleições legislativas e autárquicas, políticos pedem votos a prometer betão, gasto em obras faraónicas que em grande parte dos casos não servem para nada e oneram gerações inteiras e até nascituros, com dívidas que nunca deveriam poder ser chamados a pagar. Pelo caminho, transformam em ruínas pedaços da nossa identidade e memória coletiva, sem que se importem o que seja com isso. Lá do alto da perspetiva, com que acreditam que um néon reluzente, isso sim, é uma bela marca de modernidade, comentarão talvez em relação ao que perece, que não tem mal; eram só pedras. Que pena. E que crime.

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