Já que o coito – diz Morgado –
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.
Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou – parca ração! –
uma vez. E se a função
faz o órgão – diz o ditado –
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.
Natália Correia
3 de Abril de1982
Se Natália Correia fosse viva faria 98 anos a 13/09/2021.
Tive oportunidade de a conhecer pessoalmente, num congresso da AJEP (Associação de Jovens Escritores de Portugal) em 1992, onde esteve como convidada.
Apreciei imenso.
O poema Truca-truca foi escrito em três de Abril de 1982, na Assembleia da República, durante o primeiro debate parlamentar sobre a interrupção voluntária da gravidez.
A sessão plenária ia a meio quando João Morgado, deputado do CDS, afirmou que “o acto sexual é para fazer filhos”.
Natália Correia, ao tempo deputada pelo PSD, lutava pela despenalização do aborto, inspirada pelas declarações do deputado, escreveu o poema e pediu a palavra.
O truca-truca provocou gargalhadas em todas as bancadas parlamentares e a sessão teve que ser interrompida.
Mário Adão Magalhães
(Não pratico deliberadamente o chamado Acordo Ortográfico).