Os 100 anos do nascimento de Mário Soares foram assinalados um pouco por todo o lado de forma muito intensa, em reconhecimento do seu legado único, da sua vida e dos seus combates, naturalmente com destaque para as celebrações feitas pelo Partido Socialista e as que se realizaram no Parlamento, em que foi anunciado que a Sala do Senado passaria a ter o seu busto, para homenagear o seu contributo inigualável para a consolidação da democracia.
É mais do que justo, porque a democracia é defender e respeitar as diferenças, como sempre fez Mário Soares, e não tentar suprimi-las. Foi um combatente determinado e incansável pela democracia, um homem em que a paixão pela vida se fundia com a paixão pela liberdade.
Lutou com coragem e risco da própria vida contra a ditadura e pagou-o com o exílio e a prisão por 13 vezes. Conheceu o desterro no Tarrafal e a tortura, mas nunca se vergou nem desistiu. Era um resistente dos sete costados, um homem para quem o combate pela democracia era a causa da sua vida.
Um dos seus grandes legados foi a fundação do Partido Socialista, ainda na clandestinidade, na Alemanha, em Bad-Munstereiffel, em abril de 1973, um partido central na construção da democracia portuguesa e no desenvolvimento do país. Esteve exilado em França, onde mantinha a sua atividade política, ao mesmo tempo que ensinava na universidade, na Sorbonne e em Rennes, onde tem uma cátedra com o seu nome.
Está na categoria dos grandes estadistas, como Miterrand, Helmut Kohl, Olof Palme, Felipe Gonzalez ou Bruno Kreysky.
Já em democracia, Soares foi duas vezes Presidente da República, primeiro-ministro e ministro dos Negócios Estrangeiros, o que revela bem a densidade do seu percurso político.
Quando a consolidação da democracia esteve em perigo, foi ele que travou as derivas totalitárias, como no 25 de novembro ou quando arrastou uma multidão gigantesca para a Fonte Luminosa, demonstrando, mais uma vez, a sua intuição política.
Foi o homem que levou Portugal para a CEE, contra uma vontade dominante que rejeitava adesão à Europa. Mário Soares tinha visão e sabia bem que o destino europeu de Portugal era inegociável.
Foi também deputado desde a Assembleia Constituinte e, quando já tinha sido tudo, foi eleito para o Parlamento Europeu e, mais tarde, ainda se candidatou à presidência da República, quando a idade já ia avançada. Não foi eleito, mas demonstrou, mais uma vez, que era um homem que nunca desistia e nunca desperdiçava uma boa luta. É dele uma das frases mais felizes que se aplica tanto na política como na vida. “Só é vencido quem desiste de lutar”.
Mário Soares tinha visão, tinha grandeza e era um homem cultíssimo. É desta fibra que são feitos os grandes estadistas. Mário Soares tem um lugar cativo na longa História de Portugal, por tudo o que fez para arrancar o país ao obscurantismo e assegurar que o imperativo da democracia e das liberdades não se perdia pelo caminho.
O seu exemplo é inspirador e vai perdurar para as gerações futuras.
Paulo Pisco