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Os novos apoios às empresas em Portugal

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Desde o período pandémico que o Governo tem vindo, sucessivamente, não só a flexibilizar o calendário fiscal, mas, também, a promover mecanismos facilitadores do cumprimento voluntário das obrigações fiscais.

Despacho n.º 317/2022-XXIII, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 14 de novembro, vem prever a possibilidade de dispensa de metade do terceiro pagamento por conta do IRC relativo ao período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2022, sem prejuízo da parte não abrangida pela dispensa prevista no normativo do Código do IRC aplicável.

Já da conjugação do referido Despacho com o Despacho n.º 318/2022-XXIII, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 15 de novembro, resulta a possibilidade do aumento, para três ou seis, das prestações dos planos de flexibilização do IVA do 3.º trimestre de 2022 e do IVA mensal de setembro e outubro de 2022, continuando a ser aplicáveis as (mesmas) regras previstas no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro.

De acordo com o teor do primeiro dos aludidos Despachos, os apoios às empresas ora concedidos devem-se ao impacto, económico e social, decorrente do presente contexto inflacionista, acentuado pela conjuntura de guerra na Ucrânia, à importância de manter o apoio à atividade económica, mediante o ajuste excecional do regime de flexibilidade de pagamento de impostos, e, ainda, ao disposto no citado Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro, que instituiu diversos regimes de flexibilização de pagamento de obrigações tributárias.

Neste âmbito, decidiu, pois, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais prever a possibilidade de dispensa de metade do terceiro pagamento por conta de IRC referente ao período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2022 e, bem assim, conceder a possibilidade de aumento para três ou seis prestações dos planos de flexibilização do IVA do 3.º trimestre de 2022 e do IVA mensal de setembro e outubro de 2022, conforme se passa a analisar com mais detalhe.

A POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE METADE DO TERCEIRO PAGAMENTO POR CONTA

  • Relativamente ao pagamento por conta, prevê-se, no citado Despacho n.º 317/2022-XXIIII, a possibilidade de dispensa de metade do terceiro pagamento por conta do IRC relativo ao período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2022, sem prejuízo da parte não abrangida pela dispensa prevista no normativo do Código do IRC aplicável.

Restringe-se, todavia, tal dispensa às empresas consideradas como micro, pequenas, médias empresas ou como empresa de pequena-média capitalização (Small Mid Cap), nos termos previstos no anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro.

De acordo com este Despacho, esta medida abrange também o terceiro pagamento por conta devido pela sociedade dominante no âmbito do Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades se todas as sociedades forem classificadas como micro, pequenas, médias empresas ou como empresa de pequena-média capitalização (Small Mid Cap).

A POSSIBILIDADE DE AUMENTO DAS PRESTAÇÕES DOS PLANOS DE FLEXIBILIZAÇÃO DO IVA

  • Da conjugação dos referidos Despachos n.º 317/2022-XXIII e n.º 318/2022-XXIII resulta a possibilidade de aumento para três ou seis prestações dos planos de flexibilização do IVA do 3.º trimestre de 2022 e do IVA mensal de setembro e outubro de 2022.

De acordo com o citado Despacho n.º 317/2022-XXIII, tal possibilidade de aumento de prestações dos planos de flexibilização do IVA encontra-se dependente do preenchimento das condições previstas no Decreto-Lei n.º 125/2021, de 30 de dezembro, na sua redação atual, designadamente, da circunstância de o sujeito passivo dever ter a sua situação tributária e contributiva regularizada.

A QUESTÃO POR ESCLARECER

  • O Despacho n.º 318/2022-XXIII veio determinar “que a medida de prorrogação do prazo de entrega do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) aprovada pelo meu Despacho n.º 317/2022-XXIII é aplicável, nos termos e condições nele previstos, em novembro e dezembro de 2022 e às obrigações de entrega de imposto previstas no n.º 1 do artigo 27.º do Código do IVA.”.

Fica, no entanto, a dúvida sobre a aplicabilidade desta extensão do número de prestações dos planos de flexibilização do IVA – se apenas às empresas consideradas como micro, pequenas, médias empresas ou como empresas de pequena-média capitalização (Small Mid Cap), como parece indicar a letra do Despacho n.º 318/2022-XXIII, se a todos os sujeitos passivos deste imposto, sem exceção, como a Administração tributária já veio esclarecer

Caso se venha a entender que a prorrogação do prazo de entrega do IVA, prevista no conjunto normativo do Despacho n.º 317/2022-XXIII e do Despacho n.º 318/2022-XXIII, é aplicável apenas às micro, pequenas e médias empresas e às Small Mid Cap, forçoso será questionar se tal não configura uma violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da nossa Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual todos os cidadãos são iguais perante a lei, atento o claro favorecimento das empresas nas condições acima previstas.

A (IN)SUFICIÊNCIA DOS APOIOS ÀS EMPRESAS E AS QUESTÕES DE FORMA

  • É ainda de realçar o impacto reduzido que as medidas previstas nos Despachos n.º 317/2022-XXIII e n.º 318/2022-XXIII assumem no âmbito das empresas, principalmente tendo em conta a magnitude dos desafios e dificuldades, principalmente ao nível da inflação, que a economia portuguesa atravessa atualmente.

Existe ainda, por outro lado, o risco associado a estas medidas de apoio às empresas, designadamente do prisma do princípio da legalidade. 

Embora reconhecendo – e, até, compreendendo – os motivos que justificam este tipo de apoios às empresas, o certo é que não é adequado continuar a proceder a dispensas de pagamento de imposto e a extensões das prestações dos planos de flexibilização de imposto por via de mera instrução administrativa, nem de despacho governamental, mesmo que em benefício dos contribuintes. 

Com efeito, estas matérias, relativas a garantias dos contribuintes e a obrigações tributárias, principais ou acessórias, estão reservadas à Lei pela nossa Constituição (cf. artigo 103.º, n.º 2), sendo vedadas outras formas normativas, como o despacho normativo, o que se pode traduzir, assim, em eventual prejuízo para os contribuintes caso se suscite a respetiva invalidade. 

Por fim, sempre será de assinalar, como vimos, que a preterição do princípio da legalidade poderá trazer associado o não cumprimento, pleno, de outros princípios constitucionais, como o princípio da igualdade, algo que o Estado de Direito não deverá aceitar. 

Rogério M. Fernandes Ferreira

Vânia Codeço

Pedro José Santos

João Mário Costa

Rita Lima de Sousa

José Pedro Barros

Carolina Mendes

Patrícia da Conceição Duarte

Inês Braga Reigoto

(Tax Litigation Team

www.rffadvogados.pt

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