As comunidades portuguesas constituem-se cada vez mais como os ausentes mais presentes na vida do nosso país. A sua expressão aumenta pela vontade explícita de participarem nos destinos de Portugal, no desejo de serem ouvidos e porque hoje os níveis de qualificação e interesses da nova emigração e dos lusodescendentes obrigam a que a sociedade e as suas instituições mudem de registo na relação com os residentes no estrangeiro. Além de que nos dois círculos eleitorais das comunidades há hoje cerca de 260 mil votantes, com grande potencial para aumentar, num universo com mais de um milhão e meio de eleitores, o que torna esta realidade incontornável.
A definição de um plano estratégico para a diáspora é um dos instrumentos centrais para operar uma mudança definitiva de políticas, que possam implementar uma visão ampla e integrada das comunidades, que inclua novas abordagens relativamente às orientações tradicionais e que possa trazer à luz do dia os novos contextos da presença portuguesa no mundo.
Se por um lado o país precisa de olhar para a história da emigração portuguesa e para o seu legado para saber o que deve fazer agora, reconhecendo o esforço e as aspirações de milhões de vidas, por outro precisa de ir ao encontro das segundas e terceiras gerações, que eventualmente nem falam português, mas que pretendem manter uma ligação ao país. Além disso, é necessário olhar para a nova emigração, mais qualificada, com ocupações mais diversificadas e que passam por todos os domínios de atividade, da política ao sindicalismo, das artes à ciência, do desporto ao empreendedorismo, à cultura e às universidades.
O mapeamento é assim uma ferramenta central para que estes objetivos possam ser atingidos, e que defendi como uma das recomendações no meu relatório do Conselho da Europa, aprovado em junho de 2021 “Por uma política europeia para as diásporas”. Apesar de Portugal ser um dos países do mundo que melhor conhece a sua diáspora, pelo facto de ter representantes na Assembleia da República e políticas públicas conduzidas pelos governos, a elaboração de um mapeamento sistemático das comunidades é um fator determinante para que se desenhem políticas mais ambiciosas, inovadoras e abrangentes para reforçar os laços com quem vive no estrangeiro e cumprir o desejo de centenas de milhar de portugueses de reconhecimento pelo seu contributo e capacidade transformadora.
Assim, saber quem são, onde estão, quais as suas qualificações e ocupações, que aspirações têm, que esperam de Portugal e dos países de acolhimento, são informações fundamentais para levar a cabo o desenho de melhores e mais eficazes políticas públicas dirigidas às comunidades. Aos poucos, governo após governo e com enormes contributos dos governos do PS, dos deputados das comunidades, dos conselheiros do CCP, dos luso-eleitos, académicos e de outros atores, foi-se criando o chão onde este plano estratégico pode assentar os seus fundamentos e operar uma mudança de paradigma nas políticas dirigidas aos residentes no estrangeiro e ao legado português espalhado por todas as geografias e períodos históricos.
Se bem que seja fundamental cuidar e aprofundar a trilogia clássica nas políticas para as comunidades que são o atendimento consular, o ensino de Português no Estrangeiro e o apoio ao movimento associativo, é tempo de entrar por novos campos e abrir novos horizontes, trazer para a ribalta quem sempre esteve na sombra e concretizar aquilo que Eça de Queiróz dizia sobre a emigração, ao considerá-la uma força transformadora e civilizadora.
É para a afirmação desta perspetiva positiva que todos os futuros governos deverão trabalhar, deixando de ver os residentes no estrangeiro como os emigrantes do passado, com alguma distância e preconceito, passando a considerar a presença portuguesa no mundo como um extraordinário potencial de desenvolvimento e projeção planetária do país, como um verdadeiro poder global, que é o que realmente é.
Paulo Pisco, deputado do PS eleito pelas Comunidades na Europa