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Do século

– Tens visto televisão ultimamente? Viste aquele programa imbecil do…

– Há séculos que não vejo televisão, até estou a pensar vender a minha, só está ali a apanhar pó. O que quero saber, ou consulto na internet, tenho uma lista com uma pré-selecção googlada de temas sobre os quais quero ler diariamente, ou escolho podcasts do que quero ver ou ouvir, passo os olhos pelas redes sociais…

– As redes sociais, por falar nisso, a praga dos nossos dias, o ralo nojento da imundice humana, vês as inépcias, os idiotias, as cretinices que alguns ali escrevem? E pior, os comentários de quem responde. É pior a ementa que o cimento…

– A emenda que o soneto!

– Eu sei, estava a gozar, foi o que li num dos comentários. Fiquei sem saber se era irónico ou se a pessoa pensava que estava a citar uma grande máxima…

– LOL!

– Lá estás tu, sabes que detesto essa expressão. Mas agora a sério, achas que estaremos a viver um século das Luzes ao contrário? Recuamos, em vez de evoluir, um novo movimento deve surgir, mas de onde, quando, como…

– Sim, eu acredito num segundo Século das Luzes. Mas não vai ser já, talvez esteja apenas a nascer. O século XX foi essencialmente tecnológico, assim como o XIX foi técnico. Mas o século XX não foi um século de luzes. Pelo contrário, houve demasiada destruição e morte para ter sido um século iluminado, o progresso trouxe três guerras mundiais, duas quentes e uma fria, e ditaduras cruéis e duras de duas ideologias extremas. Varremos todos os ideais e levamo-los ao seu pior paroxismo, da esquerda à direita, dos goulags aos campos de extermínio nazi. Criámos a bomba das bombas para acabar com uma guerra e ao mesmo tempo estávamos a inventar a maneira de nos erradicarmos a nós mesmos. Fomos à Lua apenas por despique político e ideológico. Resultado, a conquista do espaço ainda hoje é vista como algo lúdico para meninos milionários e cientistas com ócio, mais do que algo verdadeiramente vital para o nosso futuro.

E de repente, olhámos o século prometido e constatámos desamparados que o progresso técnico, em que o século XIX depositava tanta confiança para levar a Humanidade a criar a sociedade perfeita, não tinha sido nada do que tínhamos sonhado e planeado. Essa é a grande desilusão do século XX.

Hoje estamos num ponto de viragem decisivo, mas como em todas as curvas, se não a soubermos dar, e parece ser esse o caso, ou fazemos fora-de-pista ou despistamo-nos. Estamos a hesitar entre estes dois neste preciso momento.

Se soubermos sobreviver aos próximos anos e décadas, a tecnologia vai permitir-nos dar um salto quântico (literalmente), com a emergência da informática quântica, da inteligência artificial, da robótica e da nanotecnologia.

Mas neste momento de viragem, estamos a viver tempos turvos, de mais intolerância religiosa, desmoronamento dos idealismos políticos, recuo das conquistas sociais, questionamento do sistema social e económico…

Será que este recuo é inevitável antes de darmos um salto para a frente, um salto de consciência desta vez, que acompanhe o avanço tecnológico?

– Olha, queres mais um café? Pffff… vou ter que fazer na cafeteira, a máquina de expressos está outra vez avariada. E é preciso um curso em astrofísica para a limpar. Uma máquina super-cara, toda xpto… Põem o homem na Lua mas não criaram ainda uma máquina de café que se auto-repare sozinha. Desse tipo de avanço tecnológico é que precisamos.

– Não era bem nisso que eu estava a pensar, mas pronto… Sim, sim, quero outro café!

 

JLC14122019 (“Gnomon”)

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