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“De minimis non curat praetor”

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A recente declaração do presidente Emmanuel Macron sobre um possível envio de tropas europeias para a Ucrânia causou surpresa e, até, algum mau estar entre os países membros da União Europeia.

Mas afinal porque é que o presidente francês fez essa declaração ?

Analisando o que se disse desde então e o que se passou hoje, nomeadamente o discurso anual de Vladimir Putin diante da Duma sobre o estado da Federação Russa, talvez se possa analisar a declaração de Emmanuel Macron à luz das seguintes razões:

1 – Putin considera como igual apenas os EUA;

2 – Putin não reconhece esse papel à “manta de retalhos” que se chama UE, união política que ele, aliás, despreza (ao mesmo tempo que reconhece o seu sucesso no campo económico, razão pela qual a quis copiar, mas à sua maneira, na zona de influência da Federação russa);

3 – Na perspetiva de uma possível (re)eleição de Trump em novembro próximo há um forte receio nas chancelarias diplomáticas europeias que Putin e ele se metam à mesa sozinhos para repartirem o Mundo e as suas riquezas, nas costas da Europa (Trump já disse que resolve a guerra da Ucrânia em 24 horas e que, se for eleito, os EUA não se consideram vinculados pelo artigo 5 do tratado da Nato que obriga automaticamente todos os Estados-membros da NATO a defenderem outro Estado-membro caso este seja atacado);

4 – Na prática, isto quer dizer que o efeito de dissuasão da existência da NATO já não existe. E se os EUA não defendem os seus aliados, pode-se depreender que, então, a outra superpotência que os ameaça tem licença para fazer o que quer.

Naturalmente à condição de haver reciprocidade e a América poder, do seu lado, fazer o que quiser com a outra parte do Mundo. Como disse Macron durante o primeiro mandato de Trump: “a NATO está cerebralmente morta”;

Ao dizer o que disse recentemente em público, Trump já anunciou que vai recomeçar o que fez no seu primeiro mandato. Dito de outra maneira, mandou recado aos russos de que quando ele chegar à Casa Branca, os assuntos da Ucrânia, primeiro, e do domínio da Rússia sobre a Europa, em seguida, serão resolvidos;

5 – Nessa perspetiva, isto é a da intenção russa de ser a potência dominadora na Europa (e fazer dela o que quiser), por um lado, e da possível eleição de Trump e, na prática, do fim do Tratado da NATO a troco da repartição do domínio do Mundo pelas duas superpotências. Era necessário haver um país europeu, neste caso a França, país dotado da arma nuclear, lembrar à “Grande” Rússia e ao “Grande” Amigo Americano, caso este tenha também a tentação de querer ser “Great Again” passando por cima da Europa;

6 – Que a Europa existe e que não se decide o que fazer dela numa conversa entre duas superpotências.

Uns (os russos) porque querem repor as fronteiras do Império russo (nova cortina de ferro) e os outros (os Americanos) porque querem resolver o seu problema chinês, que ameaça seriamente o seu lugar de superpotência económica mundial.

Ou seja, de certa maneira um “back to the past”, que é o que parece se esconder por detrás dos objetivos “Great Again” que unem Putin e Trump;

7 – Aparentemente, Emmanuel Macron tinha razão porque Vladimir Putin declarou entretanto, no seu discurso anual sobre o estado da nação, que a Rússia apenas reconhece os EUA como seu interlocutor para resolver a guerra na Ucrânia (na base das exigências territoriais russas, claro está).

Quanto à Europa, parece que não houve nem uma palavra. Talvez porque Putin não fala de coisas menores, sem importância ?

Ou, como se dizia entre romanos: “De minimis non curat praetor”.

Francis da Silva

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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