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A abstenção

Portugal tem uma das mais elevadas taxas de abstenção da União Europeia, aumentando de forma significativa e imparável desde as primeiras eleições de 1975. Recordemos que a abstenção nas eleições legislativas de 2015 ficou nos 43,07% e a das europeias de 2014 rondou os 65%, as maiores de sempre registadas nestas duas eleições.

Quando os populismos marcham por toda a Europa, as consequências deste alheamento eleitoral na democracia são imprevisíveis e é nosso dever tentar contrariar este estado de coisas.

São diversos e complexos os factores que explicam esta abstenção progressiva. Destacaria a perda de relevância de sindicatos e partidos e a “despolitização” da sociedade, com um número crescente de pessoas a acreditar que a chamada “democracia directa” das redes sociais é a solução milagrosa quando, na verdade, é algo que se esgota rapidamente e raras vezes tem efeitos concretos na sociedade.

Dada a proximidade das eleições europeias de 26 de Maio, as alternativas de que dispomos já não são muitas. Penso que será pertinente que os candidatos centrem as suas intervenções nas questões europeias, mostrando a crescente importância da União Europeia nas nossas vidas e como a nossa força e o nosso poder reivindicativo ficariam claramente diminuídos se estivéssemos fora do projecto europeu. São abundantes os exemplos concretos a que podem recorrer, muitos dos quais desconhecidos da maioria dos cidadãos. Há sempre a tendência para trazer as questões e as questiúnculas nacionais e regionais a debate e isso é algo que deverá ser evitado a todo o custo. Neste sentido, é extremamente importante o papel dos diferentes órgãos de comunicação social, cabendo-lhes também esclarecer os cidadãos, orientar os debates políticos para o que verdadeiramente importa e, ainda, combater as campanhas de desinformação, muitas vezes orquestradas por movimentos e interesses antidemocráticos.

A médio e a longo prazo, tanto a nível nacional como europeu, não tenho qualquer receio em afirmar que o voto obrigatório pode ser uma solução no combate à abstenção. Em países como a Bélgica ou o Luxemburgo, onde existe essa obrigatoriedade, as taxas de participação, entre os eleitores recenseados, rondam os 90%.

Podemos ainda facilitar o voto antecipado, permitindo, de forma simplificada, a inscrição no sítio do Ministério da Administração Interna, indicando o local onde se pretende votar ou, ainda, aperfeiçoar o voto electrónico/online, uma realidade bem-sucedida em alguns países como Austrália, a Bélgica ou o Brasil. Lembro que, em 2005, a Estónia tornou-se o primeiro país do mundo a adoptar o voto electrónico via internet em eleições autárquicas e dois anos depois a fazê-lo em eleições nacionais. Temos de aprender com os bons exemplos.

Em alguns países, como a Noruega e a Dinamarca, são desenvolvidos programas nas escolas antes de cada acto eleitoral, simulando eleições com o objectivo de despertar a atenção dos alunos para a política e, igualmente, a dos partidos para as questões mais urgentes que afectam os jovens. Alguns estudos nesses países mostram que os alunos matriculados em escolas que realizam estas simulações se tornam mais propensos a participar em eleições reais posteriores, contribuindo para reduzir o fosso de participação política entre jovens e o resto da população.

Podemos ainda acrescentar a estas medidas, a nível nacional, a reforma do sistema eleitoral, redefinindo os círculos eleitorais, criando maior proximidade entre eleitores e deputados e evitando que milhares de votos sejam desperdiçados, como sucede actualmente em distritos com menor densidade populacional, em que optar pelo voto num pequeno partido é igual a zero, não servindo para absolutamente nada. Os sistemas foram-se tornando cada vez menos representativos, os deputados representam cada vez mais as direcções dos partidos e menos as bases, o eleitorado, os cidadãos. Isto não é positivo e tem levado os cidadãos a afastarem-se cada vez mais da política.

Por último, é importante que se refira a necessária responsabilização dos políticos. Enveredar pelo discurso fácil e populista, abdicando dos princípios éticos e da seriedade que devem caracterizar o serviço da causa pública, tem contribuído para descredibilizar a classe política e afastar os cidadãos da participação activa e, em particular, do exercício do voto. O voto é um bem demasiado precioso, e que nos custou muito a ganhar, para o deixar em mãos alheias ou para servir de cheque em branco para compra e venda de ideais.

 

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