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A minha língua

A leste da minha língua
existem outras línguas
quixotescas, dantescas,
rabelesianas, dicksianas,
goethianas, miloszianas,
kunderianas, pushkinianas
e por aí fora…

E eu, que apenas posso invocar
a filosofia pessoana
e a epopeia camoniana,
sento-me entre esses dois vultos
sem temer a intimidação –

que conduz inexoravelmente
à anemia literária e,
no fim de contas,
à inutilidade da língua –,
e ponho-me a dissertar-lhes
sobre as virtudes da tua língua.

A minha língua
tem Shakespeare como norte,
mar, céu e o sal a oeste,
e o calor dos desertos a sul.

A minha língua é um músculo,
a minha língua é molhada, salgada,
sedutora, erudita, sábia,
doce, terna, afável, carinhosa,
flexível e permeável,
civilizadora e unificadora,
a minha língua espalha-se
na toalha do grande piquenique
e mescla-se com outros sabores,
açafrão, gengibre, cacau,
moca, hortelã-pimenta,
alcaçuz e tangerina,
mas também já violou,
submeteu, escravizou,

oprimiu, matou…

Mas contigo, a minha língua
porta-se bem
sem temer a pimenta,
lambe, morde, excita, estala,
enfia-se, desfia-se,

desafia, desbraga-se,
a minha língua enrola-se na tua
e percorre o teu corpo
e mergulha na tua vulva,
e os teus lábios nos meus lábios
e na minha língua.

E o que vos digo, em verdade,
é que a minha língua de nada vale
quando o orgasmo vem

e o verbo e a gramática se perdem.

 

JLC26012019
(dedicado ao meu amor Bia Vasconcelos e à minha Língua-Mátria)

 

Ma langue 

 

À l’est de ma langue

il existe d’autres langues

quichottesques, dantesques

rabelaisiennes, dicksiennes

goethiennes, milosziennes,

kunderiennes, pouchkiniennes

et tant d’autres…

 

Et moi, qui ne peut qu’invoquer

la philosophie de Pessoa

et l’épopée de Camões,

je m’assieds entre ces deux figures

sans craindre l’intimidation –

qui conduit implacablement

à l’anémie littéraire et,

somme toute,

à l’inutilité de la langue –,

et je me mets à leur parler

sur les vertues de ta langue.

 

Ma langue

a Shakespeare comme nord,

la mer, le ciel et le sel à l’ouest,

et la chaleur des déserts au sud.

Ma langue est un muscle,

ma langue est mouillée, salée,

séductrice, érudite, savante,

douce, tendre, aimable, affectueuse,

flexible et perméable,

civilisatrice et unificatrice,

ma langue s’étend

sur la nappe du grand piquenique

et se mélange à d’autres parfums,

du safran, du gingembre, du cacao,

du moka, de la menthe,

de la réglisse, de la mandarine,

mais elle a déjà aussi violé,

soumis, réduit en esclavage,

opprimé, tué…

Mais avec toi, ma langue

est bien élevée

sans craindre d’être piquante,

elle lèche, mord, excite, claque,

elle s’enfonce, se démêle,

elle brave, se déchaîne,

ma langue s’enroule dans la tienne

et parcours ton corps,

et plonge dans ta vulve,

et tes lèvres sur mes lèvres

et sur ma langue.

 

Et en vérité, je vous le dis:
ma langue ne sert à rien

quand l’orgasme vient

et le verbe et la grammaire se perdent.

 

JLC26012019
(à mon amour Bia Vasconcelos et à ma Langue-Patrie)

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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