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A guerra dentro das nossas fronteiras

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Numa conferência em que recentemente participou no Parlamento Europeu, o secretário-geral adjunto da NATO, James Appathurai, afirmou que pelo menos 15 países da União Europeia e da Aliança Atlântica foram já alvo de inúmeras ações de guerra híbrida, com o objetivo de dividir as opiniões públicas, criar instabilidade, gerar contestação contra os governos e enfraquecer o apoio à Ucrânia.

Perante o aumento claro das ameaças híbridas, sobretudo desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, as estruturas europeias encarregadas de garantir a segurança têm vindo a reforçar-se e a aumentar a cooperação para tentar combater mais eficazmente as ações de desestabilização, que podem materializar-se de múltiplas formas, sem que se perceba bem quem são os seus verdadeiros mentores, embora se suponha sempre quem está por detrás dos ataques.

Os ciberataques, as campanhas de desinformação e a interferência em processos eleitorais têm sido abundantemente noticiados, tal como atos de sabotagem, ataques a infraestruturas críticas e mesmo assassinatos. As redes sociais são hoje um dos veículos privilegiados não apenas de recrutamento de indivíduos para as ações de desestabilização, mas também para difundir mensagens de ódio e gerar movimentos de revolta. Por vezes, os migrantes são também recrutados para cometer crimes contra cidadãos dos países de acolhimento e os fluxos migratórios para pressionar fronteiras, como tem feito a Bielorrússia em relação à Polónia.

De resto, aquilo que a extrema-direita defende como liberdade de expressão nas redes sociais, não é mais do que abrir a porta para a desinformação, propaganda, principalmente pró-russa, discursos de ódio em roda livre, teorias da conspiração, que acabam sempre por potenciar descontentamentos e criar instabilidade social e política nas nossas sociedades. E já se viu muito bem que é do caos e da desordem que a extrema-direita se alimenta, fazendo assim o jogo daqueles que querem destruir a União Europeia, como é o caso da Rússia. Alemanha, Polónia, República Checa, França e países bálticos, entre outros, conhecem bem esta realidade. Portanto, estamos perante uma forma de guerra que se expande dentro das fronteiras das sociedades livres e democráticas, com propósitos bem definidos e em clara violação da soberania dos Estados.

Para grande desorientação coletiva, os Estados Unidos têm vindo a aliviar a pressão sobre a Rússia ea distanciar-se dos seus aliados tradicionais, o que pode ter consequências muito negativas na capacidade de detetar ameaças híbridas. Se o seu conhecimento em inteligência deixa de estar ao serviço dos aliados europeus ou for fornecido de forma limitada, será muito mais fácil para Putin provocar instabilidade e enfraquecer a Europa, onde temos seus defensores, os mesmos que também admiram Donald Trump. São os movimentos e partidos da extrema-direita, que são eurocéticos, que em alguns casos até advogam a saída da União Europeia, que vêm como aceitável a amputação dos territórios da Ucrânia ou que acham normal que a desinformação e os discursos de ódio contra migrantes e minorias tenham via verde nas redes sociais.

Nas negociações para a paz entre Kiev e Moscovo, já se percebeu que aquilo que a Rússia eos Estados Unidos querem para a Ucrânia não é o mesmo que a Ucrânia e a União Europeia pretendem. E que países como a Hungria e a Eslováquia, que contestam o apoio à Ucrânia, mais não fazem do que colocar-se do lado da Rússia ao aceitarem que a paz se faça à custa da anexação de uma parte do território da Ucrânia, o que significa a legitimação da violação das fronteiras soberanas de um país e do direito internacional, o que é inaceitável.

Portanto, num mundo em que as democracias estão a recuar e os regimes autoritários ganham cada vez mais força, é fundamental que a União Europeia se mantenha forte e coesa e crie os instrumentos para se defender eficazmente das múltiplas ameaças, tanto das que vêm de fora, como das que já estão instaladas dentro das nossas fronteiras.

Paulo Pisco

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