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A educação em confinamento

O encerramento das escolas, durante a pandemia, não significou a suspensão da educação. As consequências deste esforço de manutenção da formação e da educação são visíveis a diversos níveis. Métodos alternativos, dependência dos meios digitais e reorganização do discurso pedagógico, avaliação e validação de aprendizagens foram, num ápice, adotados. O que não se fez em décadas, fez-se em dois meses? Não. Não creio que esse deva ser um ponto de conclusão, mas um facto é indesmentível: fomos rápidos na resposta que demos, em especial aos nossos estudantes.

Conseguimos aprender com a partilha das melhores práticas pedagógicas e científicas, por este mundo fora. Este foi só um ensaio, e se essa preparação não foi realizada sob o jugo das exigências de carreira foi, com toda a certeza, a forma de reação mais rápida e eficaz que a classe docente alguma vez deu ao país. Acima de tudo, foi visível a dedicação aos nossos estudantes. Nem tudo foi (ou é) perfeito, mas ninguém pode duvidar da grande resposta que os professores deram para minimizar o fecho das escolas em período COVID-19.

Com o estado de emergência vieram ao de cima, em open-space, os fossos educacionais. As desigualdades estruturais, sociais, económicas e culturais são as causas dessas disparidades e mostram que o acesso à educação está longe de estar democratizado (esta pandemia demonstrou bem isso aos defensores das garantias doutrinais e legais). Dados da OCDE indicam que 87% dos inquiridos do Hundred Research Report #011 “consideram que durante a crise sanitária as desigualdades na educação agravaram-se”. Isto significa que os esforços deverão incidir nos níveis de estratégia, investimento e desafios políticos em especial para com aqueles que tendem a ter menos oportunidades educacionais fora da escola, estando já previsto um aumento nas taxas de evasão escolar. Ficou claro, ainda, que quando as escolas fecham, a nutrição fica comprometida para centenas de crianças e jovens e que há custos económicos mais elevados para quem tem o dever de vigilância dos menores, já que isso leva a perda de salário e impacta negativamente a produtividade, mesmo em teletrabalho. Mais patente ficou a ausência de uma política de assistência aos filhos dos profissionais de saúde e áreas afins, o que significa que estes profissionais estão bastante desprotegidos em situação de crise de saúde pública.

Em todo o mundo, o encerramento das escolas significou maior exposição à violência e à exploração. Quando as escolas fecham, os casamentos prematuros aumentam, mais crianças são recrutadas em milícias, a exploração sexual de meninas e jovens mulheres aumenta, bem como a gravidez na adolescência e o trabalho infantil crescem. A pressão sobre as escolas e os sistemas escolares de apoio que permanecem abertos em períodos de crise é maior, o que mostra o papel fundamental da escola e de todos os que nela são atores. A impreparação dos pais para dar apoio à educação à distância, em especial os que têm recursos limitados e frágeis capacidades digitais, deve ser alvo de reflexão dos decisores das políticas de educação, que podem encontrar aqui a possibilidade de mais um contributo social para a educação de adultos.

As barreiras de comunicação institucionais e as famílias, as distâncias entre as autoridades educativas e os professores (por falta de meios, de ferramentas e de competências digitais) levaram-nos a pensar sobre o que seria uma educação mais flexível e inclusiva. Por outro lado, as dificuldades levaram-nos a definir o que há ainda por fazer. A transição para as plataformas digitais foi difícil para os professores por razões de ordem diversa, provavelmente a mais importante das quais é que, numa altura em que se pede o foco da atenção docente no estudante, as ferramentas disponíveis são altamente diretivas e centradas no professor. Acresce a isto as deficiências técnicas na implementação da educação à distância, com a sobrecarga dos portais de acesso às aulas on-line.

Das lições que se tiram da educação em confinamento, a mais importante será que a ideia de democratização da educação, muitas vezes assumida como um dado adquirido na boca política, caiu por terra quando milhares de crianças e jovens, em todo o mundo, ficaram sem a possibilidade de aceder à aprendizagem à distância. A ideia do relançamento de quase tudo, após o desconfinamento, será pouco séria se não se perceber que a educação depende e muito de maior igualdade social e económica, da discriminação positiva de estudantes e, até mesmo, de docentes, da ideia de currículo como processo e do que se quer para amanhã neste mundo. Goste-se ou não, esta discussão é política porque se espera que ela, a política, modifique a sua própria natureza e se coloque ao serviço da igualdade e da inclusão. Naturalmente que esta discussão será inútil aos “clérigos” que se servem desta ou daquela ideologia e que se mantêm confinados nas suas certezas. A esses o isolamento não ensinou nada.

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