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A Comissão contra a UE

Vi por aí algures, à laia de partilha dum texto do “sempre isento” Institut Montaigne dos idos de 2019, chamar corajosa à actual presidente Comissão Europeia – pelo local onde o vi e seguindo o quadro dado pelas partilhas envolventes presumo que essa coragem se prenda com actual intransigência de Von der Leyen face a Putin. Mas há uma diferença abissal entre coragem e aventureirismos, apesar de os dois se confundirem. Do segundo só podemos sempre esperar maus resultados.

Em tempo de guerra a coragem é tentar fazer a paz. E nesta “equipa”, a nível da UE, só vejo Macron e, de há uma semana para cá, Orban (os tempos difíceis tem de facto intervenientes estranhos). Não há coragem nenhuma em seguir “cadernos de encargos” desenhados por think tanks que têm em conta exclusivamente “The American Interest”.

Aquilo para onde nos estão a empurrar sem explicar ao que vamos é uma crise económica originada por uma escassez energética e alimentar sem memória. Dos 15 mil milhões de metros cúbicos de gás prometidos por Biden para ainda este ano ninguém nos explica como vão ser entregues, distribuídos (a nossa rede de gasodutos estende-se em árvore de Leste para Oeste), nem sequer descarregados (devido à falta de instalações para gaseificar de novo todo esse gás natural que será entregue líquido). Mais acresce que esses 15 mil milhões de metros cúbicos não chegam sequer para cobrir três meses de importações da Rússia. Tudo isto acontece enquanto por um lado nos chega notícia que Zelensky nos pede (à UE) para cortar todas as relações comerciais com a Rússia, enquanto a Ucrânia continua a usar o gás de Moscovo, mas depois, por outro lado, e talvez porque continua a consumir gás russo como se nada se passasse, nos alerta para sermos mais duros nas negociações com a Rússia quanto ao fornecimento de gás.

A continuação da guerra na Ucrânia vai impedir o restabelecer da actividade agrícola. Antes do Verão termos as massas a custar “mais que” o caviar. Fabricas mais energívoras vão fechar por não conseguir comportar os custos de operação. A inflação será atroz. E tudo isto para quê? Para que a UE possa aderir à “plataforma de energia norte americana” como apresentado por Condoleezza Rice em 2014. Apresentação onde aliás não se coibiu de dizer que “a Europa não quer gasodutos a atravessar a Ucrânia”, essa mesma Ucrânia que agora, e já na altura para ser preciso, tão avidamente anunciamos proteger.

Dizem-nos que o propósito é asfixiar o financiamento militar russo, a própria Condoleezza Rice o diz na sua entrevista ao Welt que “acabará o dinheiro à Rússia muito antes de acabar o gás à UE”, assim, sem apelo nem agravo, sem se preocupar com o impacto que isso possa ter na UE – porque isso é secundário. Certo que a inflação anual na Rússia atingiu os 17% em Março, mas não menos certo de que a taxa de câmbio do euro para o rublo russo se encontrar no muito perto do seu ponto mais baixo dos últimos 12 meses. E depois, o que parece que a “plataforma energética norte americana” não anteviu, ou preferiu ignorar, foi a expansão dos gasodutos russos para oriente, ligando-se à China.

Enganem-se os que pensam que a vontade de Macron em negociar com Putin se deve a alguma paixão escondida. É porque percebe muito bem o barril de pólvora que tem no país. A crise económica trará a extrema-direita (que pode chegar já nas próximas semanas em França) e com ela as suas milícias, desta feita com experiência de combate adquirida na Ucrânia. Chegámos ao ponto em que a Polónia já é um dos bons, já não há “rule of law issues” porque estão na linha da frente do rufar dos tambores de guerra. A tal ponto que o mesmo Macron teve, como aliás tinha já feito há alguns dias ao Biden, que chamar ao primeiro-ministro polaco aquilo que ele é: um extremista de direita e anti-semita que bane pessoas LGBTQ.

Enquanto isso a Hungria sentirá, por não alinhar com o rufar dos tambores, o peso do longo braço da lei. A mesma Hungria que acabou de ir a eleições e dar 55% dos votos, num um contra todos, a Orban (de quem gosto tanto como de unhas encravadas, para que fique dito). Ninguém denunciou fraude eleitoral alguma, mas também ninguém se preocupou em saber porque raio o Orban ganha uma vez atrás de outra – isto para além da tradicional vacuidade do “é um populista”.

Ainda sobre Ursula Von der Leyen, e para ajudar a aferir o seu carácter, juntar só o desastre que foi a sua governança do ministério da defesa alemão, em próxima articulação com o ex-ministro das finanças Wolfgang Schauble – cuja experiência será seguramente preciosa quando chegar a hora de “financiar” a reconstrução do pais mais pobre da Europa, e o seu pendor para apagar conteúdos de telefones de trabalho ou só algumas mensagens de vez em quando.

Mário Lobo

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