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Segredo escusado

© Pixabay

A invocação do segredo de justiça pelo Governo para recusar esclarecer dúvidas sobre o número de vítimas do incêndio de Pedrógão Grande, foi simplesmente ridícula. Não se regista, a propósito, precedente equivalente. Facto insólito, foi preciso chegar a 2017 para que algum PS, que no passado dizia estar-se, digamos, que marimbando para o segredo de justiça, tenha dele querido retirar a mais extensiva e bloqueante interpretação.

Quando o edifício Grenfell ardeu em Londres há cerca de um mês, governantes e autoridades esforçaram-se em conjunto por informar o país sobre tudo quanto sucedeu. A mesma coisa na Grécia e na Rússia, únicos países que nos últimos 60 anos contaram mais vítimas em incêndios do que Portugal. Mas por cá, depois das declarações espontâneas, veio a mordaça que, como é evidente, de jurídica teve nada, mas de política tudo.

O absurdo da gestão do tema não escapa tão-pouco à cronologia e à sucessão dos factos.

Até ao momento em que a abertura de um inquérito foi noticiada a 18 de junho na Comunicação Social, a atualização do número de vítimas e o esclarecimento de circunstâncias relativas ao que aconteceu foi sendo feita por representantes da ANPC, Liga de Bombeiros, GNR e do Governo. Mas depois dessa data, sobre aspetos certamente carreados para os autos, idem, numa multiplicidade de declarações públicas de operacionais e políticos.

Significa então que todos quantos se pronunciaram após 18 de junho, sabendo, por ser público, que o inquérito tinha sido instaurado, cometeram um crime de violação do segredo de justiça? Só por absurdo. Como só por absurdo é que o gabinete do primeiro-ministro esperaria mais de um mês para comunicar, como fez a 24 de julho, que contactou a procuradora-geral da República, que lhe “confirmou” que a lista de vítimas do incêndio de Pedrógão Grande estaria abrangida pelo segredo de justiça e que a sua divulgação dependeria do Ministério Público.

Fosse assim, como é que o Governo garantiu dias antes estar tudo esclarecido? É que o segredo de justiça implica o desconhecimento dos aspetos substantivos da investigação, supostamente inacessíveis ao próprio chefe de Governo. Antecipação de tanta certeza, só por juízo premonitório.

Uma razão explica assim tudo. A dúvida que, legítima ou equivocadamente, entretanto se gerou na opinião pública.

No mais, regista-se que António Costa tenha dito ao país que “a estatística não altera a realidade. As pessoas ou estão vivas, ou infelizmente faleceram”. É verdade. Mas La Palice não acrescentaria muito.

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