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Recordar o passado… em Bragança

Fecho os olhos, e vejo. Como vejo, Deus meu! Vejo, o passado que… passou; vejo sonhos bons que não pude ou não soube realizar. Vejo injustiças, ingratidões, aleivosias, dos que julgava serem amigos… mas não eram.

Vejo melhor quando cerro os olhos, e caio em sonolência, que é um dormir acordado.

A velhice, também, tem encantos, e momentos de alegrias e de amarguras: umas vezes, o passado surge pintado a cores garridas, cheio de risos e sol; outras vezes, tudo fica negro, negro como a noite negra; e a alma constrangida, entristece e chora.

No turbilhão da vida, encontrei enganos e desenganos; e, também, grandes ingratidões: que enlutaram a alma, enchendo-a de amarguras e tristezas desinquietantes.

Em Bragança – que saudosas recordações tenho dessa cidade! – encontrei almas simples, boas e amigas, que nunca as pude esquecer. Pensei serem amizades para sempre… mas a vida separou-nos.

Em derradeira tentativa, ainda procurei reatar o ténue fio que restava; não consegui: vaidades, desprezos, orgulhos, indiferenças – sei lá! – quebraram o barbante que julgava unir o passado ao presente. Por certo não sabiam, nem sabem, que a amizade, é o maior bem, se for sincera e desinteressada.

Nunca foi tão fácil, como agora, comunicar, mesmo quando extensas distâncias separam: o telefone, a Internet, aproxima. Todavia nunca houve tanta solidão… Tanta falta de humanidade… Tanta ingratidão! …

Egoísmo? Talvez. Pensam: se não necessito do auxilio monetário; da influência que teve na coletividade; para quê telefonar-lhe? Para quê enviar-lhe e-mail amigo, se ele, agora, é velho, doente, insignificante?!…

Nas horas de solidão – e são tantas! – penso, no que ouço, vejo e leio. Penso, também, nos que já partiram; e nos que ainda não partiram… mas é como tivessem partido…

Penso, nas alegrias que passei (recordando o tempo de outrora) e na angustia, que senti, ao ver-me injustiçado no BC3, que estava em construção, e tudo por falta de carácter, por mentira, de quem tinha medo da verdade…

Penso, também, na vida pacata e rotineira que levava nessa amorosa cidade transmontana. Nas tardes aconchegantes no Café “Lisboa”; mais tarde no velho e elegante “Chave d’ouro”.

E, igualmente, nas quentes noites de Verão, passadas no jardim, à beira do tranquilo Fervença, onde os jovens namoravam e deambulavam, placidamente, embalados por românticas canções, quase sempre, de Roberto Carlos.

Penso, com o coração apertado de saudade, na casa acolhedora – meu refúgio predileto, – onde Senhora e Mãe, recebia-me sempre com afetuoso e singelo sorriso, nos lábios, e palavras maternais, que acalentavam o coração entristecido.

Tudo desapareceu. Primeiro: as pessoas, que conheci e cavaqueei, nas longas e frias noites de Inverno, ao redor das brasas rubras, da fuliginosa pedra do lar, quando a neve caia, em rolão, e o frigidíssimo vento da Sanábria, parecia fazer talhos na epiderme enregelada…

Depois: a cidade…

Pouco restou do passado: alguns edifícios, algumas ruas alindadas, e a velhíssima e vetusta cidadela, com o castelo imponente e a senhorial Domus Municipalis.

Numa tépida noite de Verão – recordo, como se fosse hoje! – assisti, encantado, no castelo, à exibição do grupo de dança “Verde Gaio”, que deveras impressionou-me.

Certa ocasião – como me lembro! – chegou a Bragança, um famoso ilusionista, que possuía dons especiais: dirigia, de olhos vendados, uma viatura; e mostrou ser extraordinário hipnotizador no Cine-Teatro perante a admiração do público.

Nessa recuada época – e já lá vai meio século! – as novidades eram poucas. As conversas versavam, em regra sobre mexericos: falava-se de namoros, das meninas do Magistério, e dos militares. Os mais velhos, e mais sisudos, comentavam programas da RTP e falavam de negócios.

Em 1969, assisti, com o Sr. Manuel do “Café Lisboa”, à chegada do Apolo II, a solo lunar; e recordo ter visto (a preto e branco) a imagem esfumada, de Neil Amstrong, a cravar, na superfície rugosa da Lua, a vistosa bandeira Americana.

Em horas de descanso, enquanto o sono não me domina: penso, medito, recordo, o tempo que foi, e já não é…

Imensa tristeza abate-se, então, na alma, ao lembrar-me, que tudo, que presenciei: cenas, episódios, conversas, que animaram a velha cidade, desapareceram, como se nunca tivessem acontecido…

Jamais voltarão as amenas e saudosas tardes de domingo no “Floresta”; os aprazíveis passeios à pousada; as cavaqueiras “eruditas”, como encarregado da Biblioteca Itinerante, em modesta tasquinha, bebericando vinho com gasosa.

Tudo pertence ao passado. Passado que se esfumou, diluindo-se em saudade, e morrerá, para sempre, quando eu partir – ai de mim! – para a eternidade.

E um tumulto de pensamentos e imagens, de saudosas nostalgias, em ondas de tristeza e ternura, invade-me a alma, constrangida… como forasteira, na própria Pátria.

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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