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Primeiro como tragédia, depois como farsa

O associativismo português no Luxemburgo é velho como a diáspora em terras do Grão-Ducado, primeiro de forma informal, depois com estruturas formais e legais. Para perceber isso basta seguir as notícias da comunidade portuguesa e ver as celebrações de aniversário das mais diversas associações. Há inclusivamente uma exactamente tão antiga como o 25 de Abril. Foi fundada no dia 25 de Abril de 1974. Há outras mais antigas e muitas outras mais recentes.

No ano passado fez 25 anos a Confederação da Comunidade Portuguesa no Luxemburgo – CCPL. Nascida como Confederação das Associações foi a prova da pujança, extensão e complexidade do movimento associativo português no Luxemburgo. A CAPL, convertida em CCPL pelo alargamento da sua base de incidência, surge para coordenar e concentrar os esforços das associações, e da comunidade, nas questões relacionadas, por um lado, com a integração no Luxemburgo e, por outro, nas relações com o estado Português.

Uma das particularidades da CCPL é ser uma confederação. Enquanto que uma federação agremia aqueles que querem dela ser membros, uma confederação tenta levar a representatividade mais além e coloca-se como representante de todos ainda que sem uma inscrição da parte destes. Um pouco como uma associação de pais duma escola – o facto de termos um filho a estudar numa escola dá-nos acesso automático enquanto membros à sua associação de pais.

A escolha de constituir uma Confederação (diga-se que as associações da comunidade espanhola aqui no Luxemburgo se organizam numa Federação) trouxe uma responsabilidade acrescida à CCPL. Sendo que os seus “membros” não tomam a iniciativa voluntária de se inscrever uma confederação deve por todas as formas tentar integrar e informar aqueles de que se porta representante. Esse é um dos motivos para a CCPL não ter assembleia geral. O órgão máximo da CCPL é o congresso, que devia reunir de 2 em 2 anos (os estatutos determinam um prazo entre congressos de entre 22 a 29 meses), e depois há um conselho da confederação, eleito em congresso, que faz as vezes duma assembleia geral nesse intervalo de tempo. É, ainda assim, uma assembleia geral com poderes acrescidos. Precisamente pela característica especial duma estrutura confederativa.

Estimam-se em cerca de uma centena (mais vinte, menos vinte) as associações de portugueses no Luxemburgo. Nas mais diversas áreas: do folclore às associações de pais, do futebol à actividade humanitária. Todas estas, sem excepção, deviam ser alvo da acção da CCPL. Mas não são. Nem metade. Nem um décimo.

Velha de 25 anos, como dito acima, a CCPL teve por única acção de comemoração deste marco uma publicação na sua página do Facebook. Foi tudo. Vinda de um período de 5 anos sem realizar um congresso a direcção aos comandos da confederação, a primeira após uma mudança aparente de regência, não teve sequer a capacidade de promover uma celebração por mínima que fosse. Um jantar, não se pedia mais, mas seria o mínimo requerido. Para outros jantares foi, entretanto, capaz de mobilizar comensais. Inclusive um de notório apoio ao então candidato a primeiro-ministro António Costa violando assim, flagrantemente, o princípio da independência política da organização. Prioridades, é tudo o que se pode dizer.

Fui membro cooptado pela direcção da CCPL a partir de Maio de 2014. Após o Verão comecei a instigar os meus colegas de direcção para a realização dum congresso, visto que o último havia tido lugar em 2010. Não foi sem alguma resistência que consegui fazer passar a ideia. Como mais tarde me disse, ironicamente, um amigo: “aquilo estava a funcionar tão bem para é que para lá foste com exigências de cumprir os estatutos e fazer um congresso?”. O congresso teve lugar em Abril de 2015. No dia do congresso não se sabia ainda quantos delegados estariam presentes, tendo muitos deles efectuado a sua inscrição no local, o que deu azo a alguns problemas resolvidos o melhor que se pode dadas as condições. Dois dias antes do Congresso ainda se faziam maratonas de telefonemas para tentar convencer as associações a participar – as tais associações de que a CCPL se reclama próxima.

Neste congresso foi aprovada uma moção que tinha por objectivo revitalizar o contacto da Confederação com as associações que, supostamente, representa. A moção pode ser consultada aqui.

Fui eleito ao Conselho da CCPL no congresso de 2015 e, posteriormente, eleito para a direcção. Em Novembro de 2015, não podendo concordar com a forma isolacionista em como a CCPL era gerida apresentei a minha demissão deste órgão, continuando a ser membro do Conselho.

Em Abril deste ano, já sem possibilidade de cumprir o limite máximo de 29 meses para a realização de novo congresso, o Conselho da CCPL aprova a organização de um congresso para o Outono de 2017. Esta aprovação tardia do congresso deve-se a inédito acontecimento do abandono em bloco da direcção da CCPL duma reunião do Conselho em Dezembro passado. Relembro que o Conselho da CCPL é o órgão decisor e a direcção o órgão executivo. Descontentes com uma decisão maioritária dos presentes a democraticidade exibida pela direcção da CCPL é o abandono da reunião. Esta situação levou a que não só a convocatória do Congresso fosse adiada como a que as contas referentes a 2015 fossem aprovadas já em pleno ano de 2017.

Das contas de 2015, há a dizer que não foram apresentados quaisquer números. O único documento a que os membros do Conselho da CCPL tiveram acesso foi ao relatório do Conselho Fiscal. Esse relatório alertava para falhas graves no registo corrente da contabilidade da CCPL, afirmando, no entanto, não encontrar motivos para suspeita de desvios de fundos. A discussão e adjectivação que se seguiu foi no mínimo algo de muito sui generis.

No dia que escrevo estas linhas, 24 de Julho de 2017, as contas da CCPL referentes a 2016 continuam a ser um mistério. Sendo chegado o Verão, a época menos propensa a qualquer tipo de trabalhos, resta-nos esperar que estas sejam divulgadas e levadas a aprovação ainda antes do Congresso que se avizinha.

Completamente afastada da realidade associativa portuguesa do Luxemburgo e incapaz sequer duma gestão própria digna de registo a CCPL nada tem hoje a ver com o “favorizar os contactos e a colaboração entre os constituintes da comunidade portuguesa no Luxemburgo” como diz nos seus estatutos.

Tendo, neste momento, contacto regular com cinco associações, não prestando contas nem dando informação da sua actividade ao seu órgão decisor, a CCPL é uma ilha. Uma tragédia no que toca à representação da comunidade portuguesa. Resta a esta impedir que a história se repita agora como uma farsa.

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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