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As falsas presenças de um deputado do PSD

 O deputado e secretário-geral do PSD, José Silvano, fez a primeira declaração de viva voz sobre as falsas presenças em reuniões plenárias, seis dias após o Expresso ter noticiado o caso, mas sem responder a perguntas dos jornalistas.

O deputado assegura não ter dado a ninguém a ‘password’ – pessoal e intransmissível – que permite o registo dos deputados na Assembleia da República, permanecendo por explicar como foi assinalada a sua presença em plenário em duas datas em que terá estado ausente, e pede à Procuradoria-Geral da República (PGR) que investigue o caso.

José Silvano assumiu o cargo de secretário-geral do PSD em março deste ano após a demissão de Feliciano Barreiras Duarte na sequência de notícias sobre irregularidades no percurso académico e com a morada para efeitos de cálculo de abonos das deslocações como deputado, estando este segundo caso também sob investigação judicial.

Três de novembro

– O semanário Expresso noticia que José Silvano, de acordo com o registo oficial das sessões plenárias da Assembleia da República, não tem qualquer falta nas 13 reuniões plenárias realizadas no mês de outubro, apesar de em pelo menos um dos dias – 18 de outubro – ter estado ausente, conforme o próprio secretário-geral do PSD admitiu em declarações àquele semanário.

Na tarde de 18 de outubro, o dirigente do PSD esteve no distrito de Vila Real ao lado de Rui Rio, cumprindo um programa de reuniões que teve início às 15:30 (hora do plenário). Apesar disso, nessa quinta-feira, alguém registou a presença do secretário-geral social-democrata logo no início da sessão plenária, quando passavam poucos minutos das 15:00.

Também no dia 24, em que esteve presente em reuniões do partido em Santarém à tarde e à noite, a presença de José Silvano foi validada em plenário pouco depois das 15:00. O deputado diz ao Expresso que terá validado a sua presença durante a tarde, mas com versões contraditórias sobre a hora do registo.

Quatro de novembro

– No seu espaço de comentário político na SIC, Luís Marques Mendes defende que José Silvano devia pedir “desculpa” e considera que o caso mina a “autoridade” do secretário-geral e contamina a presidência de Rui Rio.

Para Marques Mendes, o caso encerra “três maus comportamentos”: o do deputado que falta ao parlamento “mas que simula que está presente”, dando a password a outro para o inscrever; o de quem “se sujeita a assinalar uma presença que sabe que é falsa”; e o facto de tudo isto ter como objetivo ganhar mais 69 euros por dia (em ajudas de custo), o que considera roçar o “ridículo”.

O antigo líder social-democrata acredita, por isso, que José Silvano deve um pedido de “desculpa” e que perde, com este caso, “toda a autoridade”. “É que o secretário-geral do PSD dá ‘puxões de orelhas’ e lições de moral aos autarcas que gastaram mais do que deviam, mas depois é ele a perder a razão e a autoridade com estes maus exemplos”, argumenta.

Cinco de novembro

– O presidente do PSD, Rui Rio, assegura que mantém a confiança política em José Silvano, e classifica o caso como do domínio das “pequenas questiúnculas”.

“Claro que mantenho a confiança política. O caso não é agradável, como é evidente, não é um caso positivo, mas acha que ter uma proposta para o país, discutir o país, debater o país pode ser anulado pelas pequenas questiúnculas que estão constantemente a surgir neste partido e nos outros partidos. Não pode ser, temos de estar um bocadinho acima disso”, acentuou, à margem de uma reunião com a Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas de Portugal (Confagri), no Porto.

Seis de novembro

– Ao final da manhã, o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, informa que pediu, na véspera, explicações aos serviços do parlamento sobre alegadas discrepâncias nos registos de presenças do deputado do PSD José Silvano, que concluem que outra pessoa terá utilizado a sua palavra-passe.

De acordo com uma nota à imprensa do gabinete de Ferro Rodrigues, a Direção Administrativa e Financeira, a Divisão de Gestão Financeira e a Divisão de Apoio ao Plenário da AR referem que “a password de cada utilizador é um dado pessoal e intransmissível, mas tecnicamente nenhum sistema impede a sua partilha”, pelo que “a password do Senhor Deputado José Silvano terá sido utilizada por pessoa diferente do Senhor Deputado, enquanto este se encontrava ausente do Plenário”.

Os serviços da Assembleia da República informaram ainda que “todos os deputados renovaram, no passado mês de julho, a respetiva password” e que “não existem atualmente deputados com opção de ‘password never expire’” (palavra-passe nunca expira).

Ferro Rodrigues deu conhecimento desta diligência quer a José Silvano quer à direção do grupo parlamentar do PSD, “para os efeitos que considerem adequados”.

– À tarde, o gabinete de imprensa do PSD divulga uma nota assinada por José Silvano, em que este omite qualquer explicação sobre como a sua ‘password’ terá sido usada por terceiros.

No comunicado, o deputado assegura que não recebeu indevidamente ajudas de custo relativas aos dias 18 e 24 de outubro, uma vez que exerceu atividades parlamentares em ambas as datas, mas solicita aos serviços do parlamento que lhe marquem faltas em relação aos plenários desses dias.

“No dia 18 de outubro, assinei o livro de presenças da reunião do Grupo Parlamentar do PSD, ocorrida nessa manhã, o que confere o direito ao pagamento da senha desse dia. Quanto ao dia 24, pelas 10:00, presidi à reunião da 1ª Comissão no Parlamento, o que, só por si, conferia também direito à senha de presença respetiva”, afirma.

– À noite, e em resposta escrita a questões enviadas pela Lusa, o líder parlamentar do PSD, Fernando Negrão defende que não cabe à direção da bancada proceder a qualquer averiguação sobre o caso e remete para José Silvano a responsabilidade pela resposta às dúvidas levantadas pelas notícias: “Questões desta natureza resolvem-se pelo próprio nesta relação dinâmica entre eleito e eleitores. É também isto a democracia”.

Por outro lado, Negrão defende que “se os procedimentos estão errados, são menos fiáveis ou permitem a sua manipulação, cabe à presidência da AR propor as alterações adequadas”.

Sete de novembro

– De manhã, em Helsínquia, onde participava no Congresso do Partido Popular Europeu, Rui Rio reafirma a validade da sua confiança política em José Silvano.

“As minhas palavras não são como os iogurtes, que têm validade de 30 dias. As minhas palavras têm uma validade prolongada, só se alteram quando se alteram as circunstâncias. Portanto, tudo o que eu disse ontem ou anteontem está válido”, afirmou.

– No programa da TSF “Almoços Grátis”, o antigo líder parlamentar Luís Montenegro afirma que “quer a notícia, quer os seus desenvolvimentos não são uma questão que seja brilhante para o afirmar da posição política do PSD”.

Para o social-democrata, esta situação cria, mais uma vez, “uma cortina de fumo, um ruído que não deixa que o essencial da mensagem política do PSD se possa afirmar – num caminho que é um caminho de aproximação de dois atos eleitorais nacionais relevantíssimos, que são as eleições europeias e as legislativas”.

No mesmo espaço de opinião, o líder parlamentar do PS, Carlos César, defende que situações como a do deputado do PSD José Silvano “penalizam a imagem da Assembleia da República e dos seus deputados” e aproveita para sublinhar que os presidentes dos grupos parlamentares não recebem ajudas de custo.

– Pelas 14:00, José Silvano, que é também coordenador do PSD para a comissão eventual para a Transparência, chega à hora do início da reunião, assina a lista de presenças e deixa a sala onde decorreu a reunião, que se prolongou até cerca das 16:00, sem sequer chegar a sentar-se, e não mais voltou.

– Pelas 16:30, questionado nos corredores da Assembleia da República, sobre os motivos da sua ausência da reunião, Silvano disse apenas que esteve a fazer trabalho político, sem querer especificar qual.

Instado a explicar como pode ter sido usada a sua ‘password’ para registar presenças em plenário em dias em que esteve ausente, José Silvano considera “não ter mais nada a explicar” e diz estar “de consciência tranquila e com energia para continuar”.

– À noite, a Procuradoria-Geral da República (PGR) anuncia estar a analisar o caso para decidir “se há algum procedimento a desencadear”.

“A Procuradoria-Geral da República encontra-se a analisar os elementos que têm vindo a público com vista a decidir se há algum procedimento a desencadear no âmbito das competências do Ministério Público”, refere em resposta enviada à agência Lusa.

Oito de novembro

– O presidente do PSD esquiva-se às perguntas dos jornalistas sobre o caso de José Silvano, respondendo em alemão aos jornalistas no congresso do Partido Popular Europeu, em Helsínquia.

“Ich weiss nicht was sie sagen”, afirma (em português, “Não sei do que estão a falar”).

– Na rede social Facebook, o deputado e ex-vice da bancada Carlos Abreu Amorim critica a atitude de Rui Rio: “Não me consigo reconhecer neste estilo de fazer política. Isto não é liderança. Isto não se adequa à lógica democrática que queremos aqui. Isto nem tem graça – pelo contrário, traz-me uma enorme tristeza…”.

– Também em Helsínquia, o comissário europeu Carlos Moedas diz esperar que aquilo que leu nos jornais sobre o caso não seja verdade e que o assunto seja esclarecido.

“Espero que aquilo que se lê não seja verdade. Acho que é importante para a democracia que os deputados tenham uma maneira de atuar que seja sempre moralmente superior, que não tenha nenhuma falta e incorreção, mas não conheço o caso. Apenas li o que estava nas notícias, esperemos que seja esclarecido”, vinca o militante social-democrata.

– Questionado pelos jornalistas, à margem do encerramento da Web Summit, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, recusa comentar “casos concretos”.

“Não queria neste momento avançar nenhum comentário que pudesse ser associado a casos concretos. Apenas digo que é fundamental que as pessoas percebam que essa imagem que por vezes existe na juventude, muito negativa, de alguma política associada de forma geral aos políticos, tem um exemplo exatamente oposto que é a política de refugiados, de asilo, de migrações, que é nacional, consensual, que é isenta, que é honesta e transparente e respeitada em todo o mundo”, afirma.

– Pelas 17:30, numa declaração na Assembleia da República sem direito a perguntas, José Silvano afirma que não pediu a ninguém que registasse a sua presença em plenário quando faltou e disse querer que a PGR investigue o caso.

“Quero afirmar que não pedi a ninguém que registasse a minha presença no plenário da Assembleia da República, tal como estou convencido que nenhum deputado o terá feito, mesmo quando no exercício de cargos executivos de direção partidária ao longo de anos”, afirmou.

O secretário-geral do PSD justificou ainda só agora ter  esta posição pública: “Nunca imaginei que este episódio pudesse chegar ao patamar mediático a que chegou, atingindo de forma voluntária ou involuntária a minha dignidade, não querendo expor publicamente os meus colegas deputados”.

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