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Ano novo filipino

O primeiro choque cultural que tive em Hong Kong foi imediatamente na saída do terminal marítimo, nas passagens até ao metro. Ao longo daquela teia de caminhos estavam vários (quando digo vários entendam-se dezenas) grupos de filipinas sentadas em caixotes de cartão espalmados ou usados como “paredes” para proteção contra o vento. Era óbvio para quem passava que aquelas mulheres não eram sem-abrigos. Estavam bem vestidas, algumas até maquilhadas estavam, com bastante comida à frente (alguma já comprada enquanto outras cozinhavam) e muito bem-dispostas a conversar e a rir. Pensei que talvez estivessem à espera de um ferry ou até mesmo de um visto para ir para Macau, mas rapidamente percebi que não podia ser esse o caso.

Ao longo do dia, pelos vários sítios de Hong Kong por onde ia passando, fossem eles parques, ruas, campos de jogos, o espetáculo repetia-se – grupos e grupos de filipinas sentadas no chão a cozinhar, a comer ou nos parques a fazer jogos com as crianças, a jogar voleibol, a cantar canções…

É de sublinhar que nestes dias se vivia (muito intensamente) o Ano Novo Chinês e que Hong Kong ficou deserta de chineses (esta celebração é equivalente ao “nosso” Natal e é nesta altura que muitos aproveitam para tirar férias e visitar a família) e o difícil era encontrar uma loja ou um restaurante aberto (isto ao contrário dos avisos que me tinham sido feitos de que Hong Kong ia estar caótico neste fim-de-semana).

Como mais tarde me foi explicado, é muito frequente acontecer que as filipinas (cuja principal ocupação é serem empregadas domésticas), durante os feriados, são postas fora de casa dos patrões e, sem terem onde ficar nem dinheiro para pagar um quarto, passam aquelas noites a dormir na rua. Longe de serem sem-abrigos, não deixa de ser impressionante passar e tentar adivinhar o número de filipinas espalhadas pelas ruas de Hong Kong (segundo os meus números estamos a falar de vários milhares).

A realidade das filipinas repete-se em Macau, mas de uma maneira menos óbvia. Não acampam nas ruas mas a sua presença não passa despercebida. Vêm-se a passar na rua com crianças portuguesas pela mão, a levá-las à escola, a acompanhá-las a casa. Nos parques infantis onde por todo o lado brincam crianças portuguesas, nos bancos vêm-se apenas filipinas à espera do fim da brincadeira.

Se toda a situação é questionável? É. Pode argumentar-se a excessiva e constante carga horária, os baixos salários, a dependência para com os patrões para residir no território e a falta de direitos. Como em todos os casos existe sempre o outro lado…

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